O direito à greve foi, em quase todo o mundo e em
Portugal apenas após o 25 de abril de 1974, uma conquista dos trabalhadores. É
bem provável que mais de metade dos trabalhadores portugueses de hoje nunca
tenham trabalhado antes do 25 de abril de 1974 ou que já tenham nascido com
este direito adquirido, alguns dos quais sem lhes passar pela cabeça que este
direito já custou muito sangue, muito suor e muitas lágrimas. Sou totalmente
contra aqueles que afirmam que este direito deve ser usado
parcimoniosamente. A greve deve ser
usada como uma arma de quem trabalha contra as agressões de que são vítimas
enquanto trabalhadores, agressões ao seu direito ao trabalho, ao seu direito a
uma remuneração justa e até ao seu direito ao descanso.
Vem este meu texto hoje, a propósito das duas
greves anunciadas para, ou a começar, no dia 1º de maio, dia do Trabalhador num
grande número de países do mundo. A greve dos pilotos da TAP e a greve dos
trabalhadores do comércio. Se à greve dos trabalhadores do comércio está para
mim fora de questão não lhe dar o meu total apoio, dada a justeza das reivindicações,
já em relação à greve dos pilotos da Tap tenho a maior das reservas. No
entanto, é esperado que uma e outra tenham níveis de adesão e até mesmo motivos
para a não adesão completamente diversos.
Os trabalhadores do comércio convocados foram os
das grandes superfícies de distribuição. Está condenada à partida, quer ao
nível da adesão, quer ao impacto mediático. O impacto mediático está
praticamente reduzido a zero dada a simultaneidade com a greve dos pilotos da Tap
e do que esta representa parece representar para a privatização anunciada. Mesmo
os critérios jornalísticos, que é uma direção para a qual não vou agora
intensamente disparar não estão para aí virados. O que é isso de relevante de licenciados
em relações internacionais ou em patologia forense, ou apenas com o
"miserável" 12º ano, estarem a
ganhar 2,00 € por hora em lojas dos centros comerciais? Se é para falar em miséria que se façam
reportagens na China, na Coreia do Norte ou em Cuba...
"Mas os trabalhadores do comércio também não
aderiram à greve", poderá, quem lê, argumentar. Pois, não! Reitero eu.
Caminha-se a passos largos para a destruição dos direitos conquistados pelos
senhores do capital com a conivência dos governos democraticamente eleitos.
Quem é que, mesmo ganhando miseravelmente, com contatos precários de 3 e 6
meses (falaram-me já de casos de contratos mensais), com quase 1 milhão de
desempregados à espera e bocas em casa para sustentar, estudos para pagar,
medicamentos, muitos destes trabalhadores andam a trabalhar doentes, vidé o
comunicado do sindicato, transportes, vestuário e renda de casa, se pode dar ao
luxo de ceder o seu lugar a outro? Nem que morram no posto de trabalho, não
"poderão" fazer greve.
Quanto à greve dos pilotos são outros quinhentos.
Mas essa é amplamente debatida nos media.
Miguel Torga escrevia no seu Diário, em 1946. O
Portugueses são imbecis ou por vocação, ou por coação ou por devoção.
A atender às sondagens, por devoção não tenho
dúvida. Como por vocação é tão evidente que nem vale a pena argumentar,
resta-me dizer que sob coação, se calhar, até eu sou português.
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