Iniciamos mais um ano. Assim o obriga o calendário gregoriano que tem esta coisa mágica de fazer parecer que apenas num dia a seguir ao outro, que por acaso foi o último do ano anterior, torna logo tudo tão diferente, tudo tão cheio de esperança, tudo num tomara que desta vez é que seja. Para muitos é isso, uma renovação de esperanças; para outros, tempo de reflexão e balanços e para outros, os mais pragmáticos, tempo de ficar na cama a curar a senhora bebedeira da véspera. Não escapo ao conjunto daqueles que balanceiam espaços temporais, mas já não me revejo no grupo dos esperançosos. Quanto à curtição, se as palavras escritas não me atraiçoarem, parece que não houve nada de especial apesar de, para espanto meu (oh my God!), ter descoberto em cima da mesa do jantar / reveillon de ontem muitas mais garrafas vazias do que as que esperava.
O ano que findou foi um ano de emoções mistas, um ano de grandes alegrias e de outras tristezas que, infelizmente, não são passíveis de evitar. Ou talvez sim, mas seriam contas de outro rosário que não vou aqui desfiar. Além de outros tive o especial amargo de coração de ver partir o meu sogro, pessoa de quem gostava muito, mas também tive muitas comemorações que, tudo indica, se prolongarão por este ano. Vi o meu filho terminar a sua formação académica, hoje já arquitecto a trabalhar num atelier na Suiça por sua própria opção, vi a minha filha casar-se e vi-a terminar a sua tese de doutoramento, faltando “apenas” a sua defesa em sede de dissertação, o que poderá ocorrer já no início deste ano. No que respeita a coisas da minha própria intimidade está dito o essencial.
Foi também um ano em que se confirmou o que todos já sabiam que iria acontecer mas que era preciso legitimar pelo voto do nosso povo. Os ataques desmedidos aos funcionários públicos, com especial ênfase nos professores, o sistema de ensino que ninguém consegue reformar, o sistema de saúde que ou não funciona ou funciona mal, a justiça que não anda nem desanda com processos a arrastarem-se penosamente nos procuradores e nos tribunais, as situações dúbias relativas a putativos actos de corrupção sem esclarecimento cabal, tudo isso acabou premiado, ao manterem-se os mesmos e as mesmas políticas em frente da governação. Os milhares de desempregados que em cada dia engrossam fileiras, as empresas que teimam em fechar ou a “deslocalizarem-se”, os subsídios escassos a quem efectivamente precisa e que nos vai mostrando uma fileira de pobres a puxar-nos, hora a hora, cada vez mais para a cauda do pelotão do desenvolvimento obriga-me a que, como disse atrás, me exclua do grupo daqueles que ainda mantêm viva alguma esperança.
Por mim, vou bebendo uns copos e deixando que a água corra por debaixo das pontes. Se for vivo, amanhã, brindarei de novo ao Deus Sol.
Feliz Ano de 2010 é o meu voto para vocês, minhas amigas e meus amigos leitores.
Foto, PreDatado©2009, S. Miguel, Açores