706. Sem título - Capítulo 3.
Uma enorme ansiedade queimava-lhe o peito. Não resistiu à reunião semanal com o primo, escusou-se e abandonou a fábrica. À saída, discretamente como tudo o que fazia, pegou no celular e chamou um táxi. Estava demasiado tenso para fazer o percurso de volta a pé, como tanto gostava, embora a distância fosse curta. Sentou-se na secretária do seu amplo escritório e abriu a primeira carta.
“Caro senhor
Em primeiro lugar permita-me que me apresente. Chamou-me Marina, tenho 30 anos e sou viúva. Um estúpido acidente de viação levou-me para a casa de Deus o meu amado marido. Era chegada a sua hora e contra a vontade do Senhor não se pode reclamar.” Demasiado religiosa para o meu gosto, pensou. Se continua assim não terei paciência para ler o resto. “Agora que três anos volveram desde que se finou, é chegada a hora de refazer a minha vida. Aconselhei-me com o Sr. Padre Miguel e ele garantiu-me que não seria pecado..” Era o que mais faltava, ele, um agnóstico praticante ter de aturar uma beata o resto da vida. Pegou na carta deitou-a no cesto dos papéis. As coisas não estavam a correr bem. Abriria a segunda. Vinha do Brasil.
“Doutor,
O senhor era tudo quanto eu esperava. Quando li sua propaganda meu coração se encheu de alegria. Sou uma jovem moça do interior do Brasil disposta a tudo para abandonar essa situação difícil que o país está vivendo. Tenho uma filhinha de 4 anos fruto de um relacionamento que não deu certo. Não tenho condição para pagar a passagem, mas se o doutor quiser eu me sacrificarei para conhecer o senhor. Desculpe minha prosa, mais não tenho com certeza a cultura do senhor. Lhe asseguro que todo mundo me acha inteligente e que o fato de não ter cursado só teve a ver com poder sustentar minha filhinha desde os dezoito anos de idade. Quando isso aconteceu fazia vestibular para artes plásticas. Sou morena, tenho 22 anos de idade, 1m70 de altura, cabelos pretos cacheados, e olhos verdes. Minha perna grossa e meu jeito de andar é motivo de cantada que eu nem ligo mais. Agora meu desejo só é de ir para Portugal. Veja por favor as fotos que lhe mando. Um beijo em seu coração.”
Abriu um segundo envelope que vinha dentro do primeiro. Três fotografias, uma de rosto, uma de corpo inteiro vestida com uma blusa simples e um short e uma em biquini. Tremeram-lhe as mãos e começou a “viajar” pelo Brasil.
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