1239. Desembaraçadamente
Tal como a minha amiga Maria Árvore eu também acho o José Mário Silva um rapaz muito simpático e bem-falante. Só o “conheço” do tempo dos blogs diria mesmo só o conheço desde o Blog de Esquerda que, creio mesmo, nem terá sido o primeiro em que participou. Depois, com aspirinas pelo meio fui perdendo o contacto com a sua prosa e pior (para mim, claro) faz muito que deixei de ler o Expresso, excepção feita quando ele me é oferecido aquando da compra de algum DVD do CSI. Apesar da consideração que fiz no primeiro parágrafo não significa, nem teria de significar, que teria de concordar com ele sempre que tece uma crítica a alguma obra literária. Sem assumir a defesa de Rosa Lobato de Faria, não só não fui indigitado para tal como tampouco o saberia fazer, discordo da análise de José Mário Silva aposta neste seu post de ontem de onde realço o extracto “O que separa as duas histórias é o abismo que vai do génio literário de James à prosa desembaraçada, mas tão fácil de ler quanto banal, da autora portuguesa”. Pessoalmente, sou um adepto da chamada prosa desembaraçada e tenho alguma dificuldade em considerar a de Rosa Lobato de Faria, banal.
Lembrei-me a propósito disso de um conto que escrevi que começava assim:
“A disceptação teve o seu epílogo. Estava decidido. Como bom dendrófobo dirigir-me-ía para o deserto. Ele caminharia para os antípodas. Sentia-me fatigado de ser sempre apoucado nas minhas decisões. Assumiria de uma vez por todas o meu eremitismo. O badano, já cambado, haveria de suportar as duas ou três horas que me faltavam para chegar ao destino. Quando as adelfas e as carvalhinhas começaram a rarear nas margens do caminho, o dia abaçanava. A alimária alentecia e nem os golpes de butuca a fariam mover. Paramos. Coligi os escassos haveres, cobri-me com um bedém, com o qual me tinha abispado antes da partida, sentei-me ao velho jeito índio, pernas cruzadas uma sobre a outra e adormeci. A minha mente extenuada achapuçava-se de sonhos. Abentesmas albípedes, cujas restantes partes corporais se não viam, bandarreavam no meu espírito deixando-me azabumbado. Como seria possível em lugar tão ermo me sentir cercado. Acordei abruptamente. Autócnes de aspecto boçal faziam a festa. Nunca na vida tinham deparado com tão alva tez. Com as mãos enrugadas esbarbavam-me o capote como que se inteirando da minha condição de real.”
Era tudo menos uma prosa desembaraçada. Se banal ou não, não sei. A única coisa que sei mesmo é que ninguém leu. Quanto ao cronos subscrevo o último parágrafo do post da Maria.
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