Tenho uma vaga ideia de que o primeiro ponto que conheci foi o Ponto Azul. A minha tia Felismina tinha um rádio Ponto Azul e a minha prima Helena, a primeira pessoa a ter televisão na família, se a memória não me falha, tinha uma Ponto Azul também. A partir daí os pontos passaram a fazer parte da minha vida quotidiana tão inevitáveis que alguns ainda me causam pontos de interrogação. Um tio meu foi ponto num teatro de revista em Lisboa, a minha mãe fazia doces onde era presença frequente o ponto caramelo, o ponto pérola ou o ponto estrada e mais tarde, era eu assim já espigadote e com pontos negros no nariz e nas bochechas, além do acne juvenil, a minha namorada, quando eu lhe punha sorrateiramente uma mão na perna, picava-me com a agulha com que se entretinha a fazer ponto cruz. Entretanto já eu me acostumara a ir espreitar o livro de ponto entre duas aulas a ver se a professora de História me tinha marcado falta de atraso na única aula que começava antes do meu autocarro chegar, a estudar que nem um marrão para o ponto de química, ou a não perceber nada dos códigos nos cartões de ponto quando comecei a trabalhar na Lisnave. Ficaram aqui muitos pontos por referir como é, por exemplo, o caso das sextas-feiras, dia da semana feito de propósito para os nossos deputados irem lá picar o ponto e pirarem-se para as suas santas terrinhas ou então para Paris ou Nova Iorque que são pontos de encontro muito mais chiques. Mas eles podem porque de quatro em quatro anos lá estamos nós a votar que é como quem diz a marcar o ponto para os legitimarmos. Não sei porque é que falei nisto tudo se a minha intenção era apenas falar nos ecopontos. Os ecopontos são aquelas caixas de plástico grandalhonas que povoam os nossos bairros residenciais e que vieram resolver todo o problema do consumo e exaustão de recursos do planeta. Basta reciclar. Há-os para quase todos os gostos, para embalagens de muitas espécies sendo que, algumas embalagens têm mesmo pontos especiais para elas, que o digam as de vidro e as de cartão. Mas tal como os nossos relvados, sejam os de ao pé da porta que apenas tentam mitigar os efeitos dos aglomerados de betão onde vivemos, sejam os de jardins e parques públicos, se tornaram ponto obrigatório onde madames e cavalheiros levam os seus canitos a defecar (eu por acaso até ia escrever cagar mas, no ponto em que vou, achei feio), também os ecopontos rapidamente se tornaram depósitos dos mais variados lixos. Está-se mesmo a ver qualquer dia as ruas cheias de sofaponto, vesturióponto, movelóponto, frigorificoponto, televisãoóponto e outros objectópontos até chegarmos ao ponto em que um engraçadinho se lembre de intalar o sograóponto. O que nós somos todos é uns grandes pontos e ponto final! (ponto final, ponto e vírgula, que isto é um ponto de exclamação).
Foto: Predatado
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