quarta-feira, março 31, 2004

Reflexão

Um dia, há vários anos li qualquer coisa semelhante mas não me lembro onde. No entanto, desde essa data que não deixo de reflectir nisto. Logo eu que adoro sobremesas. Se a banana soubesse a morango, o morango a pêro, o pêro a laranja, a laranja soubesse a maçã e a maçã soubesse a kiwi. Se o kiwi soubesse a ananás e o ananás soubesse a banana, a salada de frutas teria exactamente o mesmo sabor.

PS. Não me lembro do autor. Nem me lembro se as frutas da salada, no original, eram as mesmas. Mas a ideia é aqui reproduzida com a devida vénia. O seu a seu dono.
Inverno

Ai! Esta chuva que me encharca a alma!
Ai! Este frio que me obriga a ter
A nostalgia de uma tarde calma,
D’ uma primavera que me alegre o ser.

E até o sabor a fumo do cigarro
Que tenta aquecer-me a natureza
E que me provoca demanhã, catarro
ainda mais atesta esta tristeza.

Mas se o poeta quer, pode fingir
Então o sol raiará na madrugada
A alegria voltará a ressurgir

Sou um filho do sol e do calor
Amante do mar e do sereno
E do prazer de suar se faço amor.

AF in Complexus
Lunch Time Blog

Tenho um compadre que um dia me disse que seria incapaz de comer língua de vaca, pelo facto de esta andar na boca dos animais. Que antes queria comer um ovinho estrelado. “Mas oh compadre Anastácio, você não come língua porque anda na boca dos animais e come o ovo que sai da cloaca da galinha”. “Tem toda a razão compadre, nunca tinha pensado nisso”. Mas isso, são outras histórias. No entanto, vem a propósito da minha opção para hoje. Levantei-me tarde e não tomei o meu habitual continental breakfast. Decidi fazer do meu almoço uma coisa ligeira e, eu próprio o preparei. Dois ovos numa tigela, batidos apenas 3 vezes (3 voltas leram bem?) com um garfo e com carinho. Depois em lume não muito forte mas suficiente para que o ovo não cole na frigideira, deitá-los devagarinho e não mexer. Enquanto frita a película no fundo da frigideira, organizadamente colocam-se os camarões, escaldados e descascados. Rijinhos para que o dente os sinta. Com cuidado para não partir, com uma colher de pau ou espátula de madeira, cobrem-se os camarões com o ovo. Se eu soubesse desenhar faria o esquema. Vou deixar isso para o Disperso, que ele é que é o artista da família. Depois num movimento único mas firme, levando a omoleta no ar, uma só cambalhota, ela cai direitinha mas do lado contrário sobre a frigideira. Apenas uma volta no ar. Cuidado ao tentarem fazer isso com alguém perto. Basta um olhar para o lado e ela cai-vos direitinha no chão. Fala quem já teve esse privilégio. A gargalhada geral não compensa a chatice. Duas rodelas de tomate maduro q.b. temperado com orégãos e um fio de azeite que simultaneamente cubra duas fatias de queijo de cabra fresco e aí está como se transforma um pequeno-almoço num delicioso almoço. Logo à tarde vou estar cheio de fome, mas isso agora não vem para o caso.

PS. Quando passei do meu pequeno escritório para a cozinha, o Shubert estava nas costas do sofá do sala a olhar-me por entre os vidros da porta. É o instinto animal. Miava como que pedindo encarecidamente, “convida-me para o teu almoço”. Quase me veio uma lágrima ao olho. Compensei-lhe a ração com uma guloseima das latinhas da Whiskas. Deve ter pensado, “do mal, o menos”.
Continua

A história do algarvio está a compor-se...
Escrita


Abriu um caderno em branco.
Rabiscou duas linhas na primeira página
E foi dormir.
Às seis em ponto da tarde
Chovia e a chuva molhava-lhe
Os pensamentos.
Acordou, tirou o lápis de trás da orelha
Abriu o caderno quase em branco.
Acabou de o preencher.
Deu-o a ler, o editor num movimento suave
(como devem ser suaves os movimentos com as mulheres),
Mas decidido
(como devem ser decididos os movimentos dos editores),
Jogou o manuscrito no lixo de papéis.
É bem feito!
Quem manda a escritora
Pegar no lápis ainda húmida?

AF in O Livro das Artes
Manjares

No Público o que comem os jogadores da selecção. Ai o plágio ao PreDatado sr, jornalista!!!!!

terça-feira, março 30, 2004

Sinceramente

Quando tanto havia para dizer sobre “esquerda” e “direita”, a sua origem histórica, a clandestinidade de ser de esquerda, a clandestinidade de ser de direita, qual a cultura associada a ambas as alas, porquê hoje ainda se utilizar efectivamente a classificação, o que socialmente ainda causa receios ao nosso povo estar num lado ou no outro e sei lá que mais, a cultura doutor, a cultura, deparo-me com um post tão sensaborão como este do dia de hoje, sobre a temática, no Abrupto.

Fosse eu uma pessoa culta e conhecedora da causa política, que:

a) Não iria ao Abrupto, pois já seria culto e não precisaria;
b) Não iria ao Abrupto, pois percebendo eu de política não precisaria que outros me explicassem.

Mas infelizmente como vós sabeis amigas e amigos leitores, não só sou quase analfabeto como nunca fui nada, mas nada mesmo de meter na política. Por isso eu, entre outros, vou ao Abrupto (os outros, depois eu digo). E se culturalmente tenho dado por bem empregue o meu tempo, politicamente sr. Dr. José Pacheco Pereira, sinceramente, porque é que o senhor se mete nisso?
Cost…uecas

Ai meuzedeuses. Descrever um almoço, principalmente quando ele não é o que o meu estômago esperava receber, tem um tudo-nada de depressivo. Mas ser acedido por alguém que anda à procura de “fotos de costeletas com batatas fritas”, haja paciência! Já parece aquele que andava à procura de cuecas comestíveis no blog da Gotinha.
Olhos

Alínea a) Olhos propriamente ditos

Eu sou assim. Preto no branco. Às vezes azul no branco, quando a caneta falha e, não tenho outra à mão. Já experimentei outras cores. Definitivamente não dá. Talvez por eu ter olhos clarinhos. Muitos dos blogs que eu gosto têm um design bonito. Mas custa-me tanto ler. Mesmo assim, alguns valem o esforço. Por exemplo hoje lembrei-me deste apenas porque o vou espreitar diariamente. A menina, senhora, lady, escreve bem e faz postagens muito interessantes. É, com certeza, pelo aspecto gráfico do blog, uma pessoa de bom gosto. Mas se um dia, por força do acaso, eu a venha a conhecer pessoalmente vai ter de me pagar um almoço. É que ela, se me lê, sabe que eu também como com os olhos!

Alinea b) Comentários à parte

Não gosto do nome do blog. Faz-me lembrar o banho checo. Chec Chec chec.. ai que impressão. Estou todo húmido, bolas ! Mas lá que o mocinho tem um blog engraçado, lá isso tem. E engraçado não quer dizer sempre com piada. Quer dizer legível, escorreito, interessante, consultável e obviamente com humor q.b. E preocupa-se com os comentários das “gaijas”. É d’homem!

Alínea c) Não é só a Catarina que tem um filho

A felicidade de uns pode ser o sacrifício de outros. Mas aqueles que estão felizes, não significa que não façam sacrifícios. Pois o meu querido Disperso, anda a pedir desculpa aos seus leitores porque não tem tido tempo para escrever, devido aos deveres de estudante universitário. E embora eu goste de ler esse garoto que eu amo, estou feliz pela sua dedicação à escola. Não sei se todos vós entendestes este comentário. Ele entendeu.

Passarário

A elegância no voo
A beleza nas cores
O carinho nos ninhos
A protecção ecológica
A… de andorinha,
P… de pardal e de perdiz e de pintassilgo.
A arara e o papagaio
O bico de lacre e o rouxinol
A toutinegra e a trombola
O periquito e o melro
Comos são lindos os pássaros.
Não devemos fazer mal às avezinhas.

Eu gosto muito de passarinhos fritos.

AF in Livro das Artes
Salvé

Estavam com saudades minhas não estavam? Pois é, nem para um olá aqui e nos vossos blogs eu hoje tive tempo. Mas para os meus 30 fiéis leitoras e leitores que hoje me procuraram e bateram com o nariz na porta só posso dizer SALVÉ AMIGOS!!!!
Putz

Ontem perto da meia-noite telefonaram-me a dizer que o navio iria acabar por volta das cinco da manhã e que eu deveria lá estar às sete para fazer o draft.
Esta alminha que estava a preparar-se para mais uma noite de escritas ao som do vento e no murmúrio da Diana Krall, teve de reprogramar o switch de modo a deitar-se cedo. Por volta das duas da manhã mergulhou no edredon e enterrou-se nos lençóis tendo ficado que nem o seu Schubert, um olho fechado e um ouvido à escuta, não fosse pensar que o som do despertador, lá longe, fosse os sinos da igreja da Moreanes. Às sete da manhã, como era de se esperar, lá estava esta alminha (eu hoje sou mesmo alminha) a bordo do navio para receber a notícia que antes das nove não terminava. E depois antes das dez também não e também não antes das onze. Terminou quase à uma da tarde e lá vai ficar para amanhã o Lunch Time Blog. Assim se passa uma manhã a ver navios. Putz!

PS. Mesmo com tempo nublado, a Arrábida estava linda e Tróia vista de longe até parece um lugar bonito. Só não tirei fotos porque desta vez, não levei a máquina. Mas da próxima, antevendo um corte destes, acho que encontrarei matéria para um fotoblog.

segunda-feira, março 29, 2004

Embuchei

Ontem apeteceu-me desbloquear uma conversa. Aquelas, as da treta, que não chegam a ser conversa. O tipo apareceu sorridente. Devia estar feliz porque no grupo ninguém estava a contar anedotas. Depois disse “então, cá estamos”. Um deu-se ao trabalho de dizer “é verdade”. Um terceiro “belo dia”. O sorridente “se calhar ainda chove”. O do belo dia “não”. O que teve trabalho a dizer é verdade “não sei não”. O sorridente “e então?”. O do belo dia “cá estamos”. O sorridente que já tinha dito antes cá estamos “anda tudo ao mesmo” . O do é verdade “essa é que é essa”. E eu com uma vontade tão grande de dizer ao sorridente “você além de ser muita alto é muita feio”. Só não disse porque tive medo que ele respondesse “é a vida”. Só por isso é que não desembuchei.
Lunch Time Blog

Segunda-feira. Uma pessoa vai ao mercado e ou encontra as bancas vazias ou vê carapau de olho vermelho. Não lhe resta senão optar pelo restaurante. Olha para as vitrinas e o que vê? Uma miséria franciscana. Depois pensa, não vou sair daqui sem comer. Embora nunca tenha ouvido o badalo do relógio, o cuco a fazer cu-cu, a corda no seu tic tac, tic tac, é aquela sensação da barriga a dar horas. Fica sem capacidade de raciocínio. Lê o cardápio e fica a coçar a cabeça. Não lhe apetece nada e ao mesmo tempo parece que o que vier à rede é peixe. Vê passar o garçon com uma travessa de óptimo aspecto, parecem boas as bifanas, pelo menos vêm bem ornamentadas. Come com os olhos, torna-se invejoso e diz, também quero. No início ataca com toda a adrenalina que a fome lhe transmite, mas, à segunda mastigadela, parece aqueles putos pequenos a quem se lhes começa a enrolar a comida na boca e a dizer “não quéiu mais”. Põe de lado, olha para as sobremesas e já sabe que não vai comer nada daquilo. Pede uma bica. Pede a conta também, paga, deixa gorjeta, a pensar que mal empregadinha e vai-se embora. Quando entra no carro está tão desconsolado… Mas ainda tem tempo. Então vai até à Costa, senta-se numa esplanada, pede uma garrafa de água das pedras bem fresquinha e fica a contemplar o mar.

PS. Nem vou contar nada ao Schubert quando chegar a casa. Já sei que me vai miar, roçar-me nas pernas, levar-me ao restaurante dele, pedir para me ajoelhar, baixar a cabeça na gamela e obrigar-me a comer da sua ração. Ele não quer que me falte nada.
Futebol

Onze de um lado,
Onze do outro.
Minutos a fio pontapearam-na.

Ela nunca se defendeu.
Depois abandonaram-na, ignorando-a.

Ela nunca se queixou.
Saiu inchada e redonda.
Apenas um pouco esfolada.

À volta, as tribos entoavam cânticos de guerra.

AF in Livro das Artes
Extractos ao acaso

“A comida, tal como o erotismo, entra pelos olhos, mas há pessoas capazes de meterem qualquer coisa na boca (…) Se você for dos que acreditam a pés juntos nas virtudes mágicas de algo horripilante, sugiro que coma sozinho e sem apregoar”.

Isabel Allende, Afrodite


Há pessoas que em vez de meterem na boca coisas horripilantes, fazem saltar essas horripilantes coisas da boca para fora. É só ouvi-los. Eles andam aí. A apregoar.
Profissão

Vós sabeis que eu não sou nada de fazer conjecturas, nadinha mesmo, mas mesmo assim eu arrisco dizer que ao contrário da maioria das minhas amigas leitoras e dos meus amigos leitores, este Domingo foi dia de trabalho para mim. Mas também é bem feito, pois quem me manda a mim passar uma semana inteira sem fazer népia? Pois é, mas subir e descer escadas, descer para e subir da lancha para ir fazer leituras à roda dos navios e subir e descer escadas de portaló, estou aqui que nem posso. A minha perna esquerda está quase presa, mas também é bem feito, quem manda a perna direita ter andado toda a semana a queixar-se? Oh meus amigos, isto, quando há ciática, tem de tocar às duas (fora as costas). Falando estritamente de pernas, a esquerda não é mais que a direita. Portanto ela que faça o favor de não armar ao pingarelho. Mas mesmo assim não me posso queixar muito. É bem melhor do que ser vendedor. Foi aliás por causa das coisas, que eu deixei de trabalhar em vendas. Ah não sabiam? Pois é verdade eu trabalhava em vendas e a minha alcunha era “A prostituta”. Eu, como vós sabeis não sou nada (onde é que eu já li isto?), mesmo nada de depreciar qualquer profissão. E ser prostituta não é nenhuma profissão que eu considere menos. Mas ser vendedor e chamarem-me prostituta, só mesmo coisa dos meus amigos. Querem saber porquê? Pois é, já esperava que tivésseis respondido em uníssono: “Queremos!”. Vejam só:

Eu trabalhava nos horários mais estranhos…
Pagavam-me para fazer o cliente feliz…
Às vezes, o cliente até pagava bem, mas os meus empregadores ficavam com quase tudo...
O meu trabalho ía sempre além do expediente…
Eu era recompensado quando aceitava realizar as ideias dos meus clientes…
Cada vez reduzia mais o meu leque de amigos sendo que praticamente só andava com outros colegas da mesma profissão…
Sempre que ía a um encontro com um cliente tinha de estar bem apresentável…
Os meus clientes queriam sempre pagar menos e que, ainda assim, eu fizesse maravilhas…
Quando me perguntavam em que é que eu trabalhava, tinha sempre dificuldade em explicar com precisão…
Quando as coisas davam para o torto era sempre culpa minha…
Todos os dias, ao acordar, pensava e dizia para com os meus botões: NAO VOU PASSAR O RESTO DA VIDA A FAZER ISTO!!!!

Então? Qualquer semelhança com uma prostituta não é pura coincidência.

domingo, março 28, 2004

Azul

Pela cor pensei que fosse de um planeta desconhecido. De Marte não é, porque em Marte eles são verdes. Dizem, porque o robot ainda não os descobriu. Pela leitura do blog, que eu desconhecia até hoje, vejo que a cor só pode ser de uma tripeirinha. E já que tenho um lagarto na minha lista e, ela tem um blog bem interessante, vou pô-la de lado. Que é como quem diz aqui na lista do lado. E ainda bem que comer também é um prazer para ela. Não gosto de anorécticas.
Lunch Time Blog

Às camadas. A primeira de cebola, tomate, pimentos, alhos. Digamos leguminosas para facilidade de escrita. Depois uma camada de Safio, Tamboril, Raia, Pata-roxa. Digamos peixe para facilitar a escrita. E por cima uma camada de batatas às rodelas. Digamos tubérculos para complicar. Outra camada de leguminosas, outra camada de peixe, outra de tubérculos e finalmente outra de leguminosas. Arrumadinhos assim, juntou-lhe um pouco de vinho, um fio de azeite, um pequeno piripiri, salsa, louro, sal q.b. Tapadinho que foi o tacho isovapórico e regulado o fogo para uma distribuição uniforme foi deixar os aromas espalharem-se pela casa. Seguindo o cheiro, nem abri a boca enquanto comi. No final virei-me para a minha mulher e apenas tive palavras para dizer. Parabéns!

É verdade que eu de brancos não falo. Não é uma questão etnológica. É enológica mesmo. Mas hoje vou abrir uma excepção porque a caldeirada mereceu. É da Herdade do Esporão de 2001. Tenho a certeza que se o tivesse bebido antes teria ganho mais. Mesmo assim o seu aroma jovem e fresco, mantinha-se. E a cor citrina que se lhe via no ano passado ainda lá estava. O sabor macio e um pouquinho mas suportável acídulo. Não foi um erro exagerado ter-me esquecido dela na garrafeira e não desacompanhou a qualidade do peixe. Fiz uma boa opção. Ah o nome? Vinha da Defesa.

PS. O Schubert roçava-nos nas pernas, dengoso, insinuante. Amimado é o que ele é. Mas os temperos e as espinhas não nos convidava a convidá-lo a ele, Schubert. Assim foi recambiado para a ração de gatinho. Tadito.
Continua

Aos poucos o conto vai sendo construído. Têm lido?
Horário

Porque é que escrevo à noite e de dia também? É porque à noite eu não tenho sono. E de dia também não tenho. Sempre que à noite me apetece escrever sento-me no Word e teclo. Faço-o sempre com letras pretas sobre folhas brancas. De dia também faço isso, excepto ao lusco-fusco. Ao lusco-fusco utilizo um bloco de notas e uma máquina fotográfica. Então faço das palavras a minha noite. Porque durante o dia falo. À noite não. Só me apetece dizer até amanhã. Mas às vezes, está errado porque nesse dia à noite já é amanhã. È por isso que faço das minhas noites, por vezes dias inteiros. E é nessas alturas que eu digo que só escrevo à noite e de dia também. Porque de dia não há nada para escrever. Aquilo que se escreve de dia já é antigo à noite. Aquilo que se escreve de noite é novo de dia. Eu gosto de coisas novas. Quantas pessoas se lembram quanto tempo demoraram ontem de manhã para ir de casa ao emprego? Isso foi ontem demanhã. Mas de manhã quase todos sabem a que horas se deitaram ontem à noite. É também por isso que a noite é mais fascinante que o dia. Se houvesse Sol à noite, então, a noite ainda seria mais bonita. Porque as cores realçam mais com o Sol. Excepto as cores da noite. As cores da noite também são mais bonitas que as cores do dia. Porque de dia não há preto e branco. E por não haver preto e branco a escrita é mais triste de dia. Porque é uma escrita a cores e eu não sou pintor. Hoje os relógios roubaram uma hora à minha noite.
Arquitectura

O prédio tem cento e vinte e cinco andares.
A escada vai até ao trigésimo.
Do trigésimo ao nonagésimo uma corda,
Com nós.
Daí para cima tem um elevador
Descai para a direita no sexagésimo segundo.
Uma ponte aérea atravessa-o,
No nonagésimo quinto
Onde existe um shopping center.
Lindos jardins interiores
Nos patamares do octogésimo sétimo,
Irradiam o verde no sentido norte-sul.
Um homem faz a barba,
Olhando o reflexo nos vidros espelhados
Do quadragésimo quinto andar,
E assobia.

AF in Livro das Artes

sábado, março 27, 2004

Cabeçadas

Ontem, ao entrar para o carro, dei uma cabeçada tamanha no rebordo da porta. Vi tantas estrelas, mas tantas, que acho que descobri uma super nova. Não cuidei de imediato de pôr um pouco de gelo e vai daí, hoje estou com uma dor de cabeça que nem me aguento. Portanto se por acaso, eu escrever algum disparate, e vós amigas leitoras e amigos leitores, bem sabeis que eu não só nada, mesmo nada, de escrever disparates, se isso acontecer, como estava escrevendo, peço que me desculpem.

PS. Além disso também não dormi por causa da ciática. E lá fora chove. E acho que vou almoçar peixe de novo. E podia ser pior?
Tempo

Hoje foi o dia de abrir a correspondência. Durante a semana vou trazendo para cima e ponho no montinho em cima da secretária. Se olho para o envelope e me parece estranho eu abro na mesma altura. Mas a norma é amontoar. Esta semana: conta da luz, conta do gás, extracto do banco, visa para pagar, publicidade das Selecções, da art gallery, da loja Masculini, declarações (ainda?) para o IRS, seguro do carro, conta do telefone, factura da TV cabo, carta do Benfica para subscrever o empréstimo obrigacionista, convites da Academia Almadense (infelizmente um já fora de prazo, mea culpa), imposto municipal sobre imóveis, jornal do Seixal, jornal Lidl, Revista Unibanco, Revista da CGD (esta com bonitas fotos), Tap Navigator (perdi o Gold, há tanto tempo que não viajo), revista Selecções. Ufa, não sei se me lembrei de todas. Agora vejam, a maioria eram contas para pagar. Depois do tempo todo que perdi a abrir cartas e a ler o conteúdo será que me sobra tempo para pagar as contas? Que esperem, porque um homem não é de ferro. E além disso vamos ter uma hora a menos este fim-de-semana.
Títulos

No Expresso: “João Soares avança contra Ferro”. A última vez que me aconteceu foi contra uma parede. Avancei demais e parti o carro todo. Vou ler o artigo completo para ver como foi o acidente.

Também no Expresso “Portugal está fora de moda”. Se calhar é por isso que está em saldo. Deve ser fim de estação. Mas parece-me que os espanhóis não são vaidosos e compram tudo.

Diário de Notícias: “Mário Soares critica brutalidades de Durão”. Pois, pois violência doméstica.
Facas e Garfos

Se falam de comida dá-me o cheiro. Esta e este eu leio e parecem-me gostar de pratos.
Extractos ao acaso

"O carrasco existe para matar. Aquele que mata e não é carrasco é como aquele que talha e não é carpinteiro. É raro que aquele que talha e não é carpinteiro se não fira nas mãos."

LAO TSE in Tao Te King

Amanhã e depois e depois vou olhar as mãos do rabecanista: Quero ver se ele é sapateiro. Quero ver as mãos dos que passam betume para disfarçar a feridas. Carrascos com mãos de não carrascos.
Agricultura

O pai, a mãe, o filho
A charrua, o arado, a enxada
Preparados para a faina
O sol já tinha nascido.

O boi esquelético puxando.

À noite a filha mais nova
Preparava-lhes um caldo de couve-galega.

AF in Livro das Artes

sexta-feira, março 26, 2004

Lunch Time Blog

Hoje fui à Cabrinha II. Fica na Qta. do Serrado assim como quem vai na via rápida para a Costa da Caparica. Depois sai na direcção Universidade, e quando se dirige ao Monte da Caparica, vira para o Serrado. Se não perceberam é só perguntar por ali. Feita que foi a publicidade, Carlos (o dono é o meu amigo Carlos), deves-me um almoço. Ele não merece porque ele é lagarto. E ainda mais depois de uma derrota do Glorioso. Se eu não tivesse aceite a sugestão dele para um atum fresco de cebolada, que não só estava delicioso, mas também tinha um aspecto tão incrível que até os olhos comeram, teria comido uma caldeirada de Benfica vs Sporting. Bebemos o vinho da casa em jarro. Era um tinto escorreito, não lhe perguntei mas, pelo paladar, era um tinto de Pias, a raiar o razoável. Sei que esta tarde a cebola vai fazer das dela. Se não for no estômago, vai ser no hálito. Nada que o dentífrico não possa disfarçar. Pelo sim pelo não, só vou beijar à noite.

PS. Schubert meu lindo, desculpa-me mas o dono só te vai ver logo à noite. Vou-te pedir a mãozinha, tu vais dar-me uma dentada que é como quem diz na tua linguagem que me estás a dar um beijinho. Ainda bem que ainda não beijas na boca, senão irias com certeza dizer: «Este gajo, é a segunda vez esta semana que come peixe. E desta vez de cebolada. E eu na ração, sempre ração. Já me estou a passar com ele.”»
Gastronomia

A vodka chegou em pequenos copos.
Rapidamente e de uma só vez
Viram-se os fundos.

O fígado em postas e de mãos postas
Ainda se ajoelhou rezando.
Ninguém lhe escutou as preces.

Regaram-no com vinho,
Dois dentes de alho.
Macerou umas horas.

As iscas estavam prontas.

Um shot vindo não sei de onde
Atingiu-o no baixo-ventre.

Não teve tempo de morrer com cirrose.

AF in Livro das Artes

quinta-feira, março 25, 2004

Benfica

Apesar da derrota... Benfiiiiiiiiiiiiiiiicccccaaaaaaaaaaa!!!!!!!
Amigos da Onça

Aumentei-te a responsabilidade, Artur. Acabei de adicionar o teu fotoblog. Agora vais ter de mostrar a tua arte às minhas amigas e aos meus amigos. Eu não sou nada de dar punhaladas nas costas. Nadinha. Sou mais assim pró tipo... amigo da onça.
Lunch Time Blog

O cherne (não se estejam a rir… não é esse, eu aqui não falo de política) hoje vinha a nadar em massa. É coisa que o outro cherne, aquele de quem vocês se riram antes, não sabe fazer. Diz que está de tanga. Um caldinho com os alentejanos temperos, onde o poejo dava um ar de sua graça, ou seja, de seu cheirinho. Hummm… de comer e chorar por mais. Por acaso só chorei quando veio a conta.

PS. Esta tarde não vi o Schubert, mas tenho a certeza que quando lhe contar que estive a comer peixe ele vai me perguntar: «Afinal aqui quem é que é o gato?»
Sandes de presunto

De vez em quando gosto de conhecer quem lê o meu blog. Se a gente escreve, mesmo que algumas vezes tenha um carácter umbiguista, é porque a gente gosta também de ser lido. Como vós sabeis, amigas leitoras e amigos leitores eu não sou nada de ficar vaidoso, se sou lido por pessoas mais ou menos importantes no panorama das letras ou das ideias, ou não. Não reconheço importância superlativa a ninguém pelo que, para mim, eu sou sempre lido por pessoas importantes. Fazem parte do grupo dos que me gostam de visitar e isso é suficiente para eu os considerar importantes. E a todos os que aqui vêm e perdem um bocadinho do vosso tempo a ler coisas, sim não passam de coisas, que a mim me dão prazer em escrever, a todos o meu muito obrigado. Vem isto a propósito (eu sou um chato nas introduções, não acham?), de ter verificado que um dos meus últimos leitores entrou no meu blog à procura de “sandes de presunto”. Pois minhas amigas e meus amigos, eu bem sei que aqui não é um snack-bar e que mesmo que o fosse as minhas sandwiches ficariam muito atrás de algumas que me têm sido servidas, em Chaves, em Lamego, no meu Alentejo profundo. Mas que o leitor se quedou alguns minutos a ler-me isso eu garanto. Será que depois de ter lido um Lunch Time Blog, desistiu de ir comer a sandocha? Ou embuchou e teve de sair para uma malga de vinho tinto?

PS. Ai como eu gosto da palavra sandocha!
Continua...

Terminou hoje o Capítulo I.
Extractos ao acaso

“Imagina que alguém mandava calar o canto dos pássaros porque o ouvido interior dessa pessoa tinha ouvido uma melodia mais bela! Ou que mandava murchar as flores e as árvores porque o seu olfacto interior descobrira um aroma mais maravilhoso que os aromas da própria natureza! Imagina finalmente, que alguém destruía a arquitectura e os objectos de arte porque se apaixonara pelas coisas impalpáveis”

Jostein Gaarder, Vita Brevis


Vou passar-lhe as mãos pelo cabelo e cheirar, porque têm o cheiro dela, o feminino cheiro da natureza. Nenhuma melodia interromperá os sons da noite. Os pássaros dormem. Nada será destruído.
Olimpismo

As cordas, os cantos, o tapete, o gong.
A gritaria, a provocação, o aplauso.

O vermelho, o azul.
As luvas encostadas, à cara, ao peito, ao estômago.

Contou-se de um a dez
O juiz levantou-o do chão.
Abraçaram-se e levantou o braço.

O braço ainda continuava no ar
Acenando-lhe o último adeus.

No funeral ninguém pagou bilhete.

AF in Livro das Artes
É preciso é calma!

Telefonei ontem para um organismo público. Atenderam-me simpaticamente e informaram-me que assunto seria com a Dona Lurdes, mas ela não estava. E agora? Se não se importa ligue mais tarde. Está bem eu ligo, obrigado. Desliguei. Liguei mais tarde. Ninguém atendeu. Amanhã vou ligar de novo para falar coma D. Lurdes… se estiver.

Dirigi, em tempos um departamento de atendimento a clientes. Este assunto nessa época seria assim:

Telefonei para a empresa X. Atenderam-me simpaticamente, anotaram a minha questão mas, infelizmente, teriam de me pedir para aguardar alguns segundos. Aguardei, enquanto assobiava baixinho «a melodia do desespero». Dez segundos depois e, uma vez que o assunto era da competência de outro departamento e não me podiam dar a resposta de imediato (provavelmente a D. Lurdes não estava), pediram-me gentilmente um telefone de contacto ou fax (não se usava e-mail). Quinze minutos depois, está? É o Sr AF? Sou sim, faça favor. A resposta à questão que nos colocou é a seguinte.

Bom mas isto foi só há 12 anos. Ainda não houve tempo para os organismos públicos aprenderem. Já começaram a ficar simpáticos. Agora só falta aprenderem a trabalhar. Não sejamos exigentes não é?

quarta-feira, março 24, 2004

Lunch Time Blog

Ai. Eu não vos dizia? Eu avisei na segunda-feira. Frango! Ai meu Deus! Frango. A Fátima ainda tenta disfarçar, uns alhinhos, um pouco de vinho branco, um tudo-nada de pimenta preta moída na altura, um fio de azeite puro de oliveira no fundo da frigideira, uma corzinha bem homogénea, mas… frango. Ai que saudades do Faisão. Quando eu comia três tigelinhas dele. Mãe por favor, quero uma das tuas sopas!

PS. O Schubert deve ter visto a careta que eu fiz quando me sentei à mesa e olhei para o frango. Foi direito ao pratinho dele, mastigou a ração para gatinhos e olhou para mim. Triunfante ou irónico? Só ele é que sabe.
Continua

Está a ganhar forma. Novos parágrafos já disponiveis.
Novos

Vai ser dificil ler. Pelo primeiro post, já sei o que me espera. Dicionário em punho. Mas tivesse eu bebido os néctares que Homero ou Vírgilio beberam, ou não me tivesse o raio da neuropatia atingido, que não teria que obsecrar aos deuses para que a minha página não fosse tão nefelibata. Felizmente que parabolizo e embora os meus textos não sejam perolinos nem relampejantes também não são propriamente sebentices.
Extractos ao acaso

«A tusa, dizia Evaristo», disse Austin, sorrindo, «a tusa é que interessa. Havia aquele gajo, dizia Evaristo, que esfregava um tijolo nas costas e parece que lhe dava tusa, deve-se fazer seja o que for, o que interessa é endireitar o mastro…

Dinis Machado, O que diz Molero


Pois hoje, acordei meio estúpido. Estou sem tusa para nada. Parece que levei com um tijolo nas costas.
Tecnologia

Quais Evita e Peron,
Na varanda acenavam
Ao ensurdecedor barulho.

Quando voltaram para casa,
A multidão de seres minúsculos esverdeados
Voltou para o pólo
Onde tinha sido descoberta a água.

A nave voltou quatro dias depois.
De mãos dadas olhavam o álbum de fotografias
Que se auto-sustentava num campo anti gravítico.

Em apoteose fizeram amor.
Pairavam.

A população de robozinhos iria crescer,
Mais mês, menos mês.

AF in Livro das Artes

terça-feira, março 23, 2004

Preguiça

A lista das pessoas que eu visito vai crescer. Sou um bocado preguiçoso para andar sempre a fazer estes acrescentos mas cheguei à conclusão que serei muito mais preguiçoso se as tiver na lista de links. Basta um clique.

Primeiro as meninas que eu sou preguiçoso, mas também cavalheiro.

A minha sobrinha Sara cujo blog está crescendo. Ai Ai Vida
Uma elemental criatura. Olá Duende.
A lógica de ler, ler, ler..uffa escreve tanto. Bom dia Espectacológica.
Um raio de luz. Por enquanto é só um raiozinho mas já flameja. Ilumina isso Analuz.
Uma mimosíssima e terna Borboleta. Voa, Voa Andreia.
Uma salada de frutas com chocolate, bem saborosa. Há FrutóóóóXicolate
Uma menininha babada. É paté ou Pat, mas é Patricinha.
Outra Sara. Esta diz que é Xata.

E agora os “gaijos”.

O tipo é lagarto mas está sempre a pôr-me ao corrente do que se passa na bola. Não?
Um momento de paz. Amigo, não me converto ok? Mas a Palavra é a Palavra.
Conhecer as opiniões da esquerda no texto e as da direita nos comentários. Aí Barnabé!
Ler políticos conceituados. Quase sempre opiniões para reflectir. São causas.
É cultura, pessoal. E desta não se consegue de borla por aí. Nem que seja crítica.
And last but not least
Para me desbloquear os neurónios. Esse aí desbloqueia.

Por agora chega que estou com preguiça para mais.
Sobremesa (III)

Coloco-te nas orelhas só por graça,
Dentro de água gelada ou sobre gelo.
Faço de ti licor e p’ra bebê-lo
Te verto em copo ou cristalina taça.

No meio de chocolate licoroso
Te chupo e faço, por isso derramar
Correndo no queixo sem queixar
Um liquido suave e bem viscoso.

De todo o jeito, para te comer eu sou capaz
Saltar veredas e te colher na árvore
Sejas tu vermelhinha ou como mármore,

Na praça adquirir mais de um cabaz
Tal como as conversas, é assim:
Cereja puxa cereja até ao fim!

Alves Fernandes, in Sobremesas
Lunch Time Blog

O espeto de pau de loureiro afiado. Implacável, um a um ía esventrando os pedaços. Alternadamente. Os suculentos cubos de lombo, o pimento, o toucinho, a cebola, o chouriço, o cubo de lombo, o pimento, o quadradinho de toucinho, a rodela de cebola, o chouriço, e uma vez mais, lombo, pimento, toucinho, cebola, chouriço. Depois foi colocar a espetada na grelha e roborizá-la. Rodá-la sobre si própria em movimentos como que pré-programados, sem deixar que a chama lhe lambesse as fronteiras. Apenas o calor para a fazer corar. No prato, os aromas dos legumes nas gorduras, quanto baste. Na boca, a delícia dos tacos de lombo a desfazerem-se. De vez em quando molham-se os lábios com um golinho de Esteva, Douro, DOC, 2000, rubi intenso, espuma rosada, de cheiro jovem e frutado e sabor macio. Depois calmamente umas cerejas. Em cama de água e gelo. Dois dedos de conversa. Duas cerejas. Um café. Hoje fumei um charuto. Não digo a marca porque não faço publicidade ao tabaco. Numa de pedagogia.

PS. Felizmente o Schubert não lhe reconheceu o cheiro. Afastou-se enquanto eu refastelado no sofá ouvia as últimas na TV. Vocês estão a imaginar eu a chegar a casa e encontrar o Schubert de Monte Cristo (ops… descaí-me) na boca a ver a Telejornal? Havia de ser bonito, havia…
Extractos ao acaso

Un solo ser, pero no hay sangre.
Una sola caricia, muerte o rosa.
Viene el mar y reúne nuestras vidas
y solo ataca y se reparte y canta
en noche y día y hombre y criatura.
La esencia: fuego y frío: movimiento.

Pablo Neruda, El Mar


Vou sair, respirar o sol, banhar-me no vento, abraçar o mar. Depois pintarei o rosto de castanho claro.
Design

Tirou o último cigarro do maço
Tossiu.
Olhou para cima da estante
Onde um relógio de pau-preto,
Sem debruns nem de ouro nem de latão amarelo,
Mas com mecanismo suíço,
Lhe apontava as 4h32m.
Não teria tempo de comprar outro maço.

Sentou-se na cadeira, em couro enrugado, da secretária
Balançou a cadeira para trás
Esticou o braço
E enfiou o cigarro na boca da caveira de acrílico que lhe decorava a mesa.
Adormeceu de seguida.

AF in Livro das Artes
Religião

Obviamente, nem eu precisaria dizer isto, que as minhas amigas leitoras e os meus amigos leitores sabem que não sou nada de meter em assuntos religiosos. Nadinha mesmo. Eu nunca falei aqui em religião e prometo que irão passar várias luas até que o volte a fazer. Eu já fui católico (prefiro dizer isto do que utilizar o eufemismo de católico não praticante), baptizado, crismado e casado sob a bênção da igreja católica e por isso não me resta mais do que respeitar as convicções religiosas de cada um. Era o mais que faltava não respeitar os outros. No entanto um e-mail que recebi há uns dias e que por sorte não fez parte dos 75% que eu mando directo para o lixo sem abrir, tinha uma frase, que citarei mais tarde, a qual me inspirou estas linhas. Quando eu era solteiro, o meu, na época, futuro cunhado era já um fiel seguidor da igreja evangélica. Hoje é um proeminente pastor e uma pessoa de quem eu gosto muito. A sua personalidade religiosa, um tanto ao quanto ecuménica, permitia-lhe uma abertura de espírito para debater as igrejas e as religiões com outras orientações religiosas. Lembro-me nessa época de durante semanas a fio ele receber em sua casa, um duo mórmon e passarem horas a conversar. Vi-o discutir ideias com padres, com pessoas sem religião e com outras correntes evangélicas. Expectável era que, no caso dos mórmones, nem eles virassem Luteranos, nem o meu cunhado viesse a ser um futuro Elder. Como aliás se confirmou.
Comigo passou-se um caso até curioso e engraçado para ser contado. Quando eu era católico, todas as manhãs de Domingo eu assistia à Eucaristia Dominical na televisão. Pois era a essa hora que, não sei se de propósito ou apenas por coincidência de horários, sempre as Testemunhas de Jeová me tocavam a campainha. Um dos dias, convidei-os a entrar e os seus olhos brilharam. Conduzi-os à sala, onde a TV transmitia a Santa Missa, convidei-os a sentar e não só. Pedi-lhes que comigo assistissem à transmissão religiosa e que no final da celebração, então sim, conversaríamos. Não vale quase a pena vos contar o desfecho pois, é óbvio, que já adivinhastes. Não aceitaram o convite, o brilho nos olhos perdeu-se e saíram, educadamente.

Contado que foi o episódio e pedindo desculpa pela maçada da enorme introdução que fiz, vou partilhar convosco a frase que, pressupostamente é atribuída a um vivido sexagenário e que recebi no e-mail:

“As pessoas que querem compartilhar as visões religiosas delas, consigo, quase nunca querem que você compartilhe as suas com elas.”

Vocês podem ficar a pensar se tem ou não alguma verdade inserida. Eu tenho a certeza que sim.

segunda-feira, março 22, 2004

Extractos ao acaso

“Sinto que até mesmo para mim a onda se eleva. Incha; dobra-se. Tomo consciência de um novo desejo, de qualquer coisa que se ergue em mim como um cavalo orgulhoso, cujo montador esporeou antes de obrigar a parar. Que inimigo vemos avançar em direcção a nós, tu, a quem agora monto enquanto desço este caminho? É a morte. É ela o inimigo.”

In As ondas, Virgínia Woolf


Hoje um terrorista (Sharon) assassinou outro terrorista (Yassin); é a celebração da morte, da expansão da morte, da propagação da morte. Quem vai parar este cavalo, antes que o cavaleiro continue a esporear?
Lunch Time Blog

Pronto e lá voltamos nós à banal rotina dos almoços caseiros em dia de semana. Vamos ser confrontados com o estafado bife com batatas fritas, a costeleta grelhada, os filetes de pescada com arroz de ervilhas, as salsichas embrulhadas em couve lombarda, a posta de peixe cozida com grelos e, no fim, a maçã starking, o pêro bravo de esmolfe e, se tivermos sorte e o tempo der para mais, uma taça de morangos com ou sem chantilly. Resta-nos a consolação de chegar a casa e “o seu almoço já está pronto”. Obrigadinho. E a vingança! Sim a vingança de ir à garrafeira e escolher um bom vinho tinto. Pelo menos não se há-de estragar a tarde.

PS. Ainda bem que o Schubert está a dormir. Quando não, com três ou quatro miaus, teria vindo reclamar do post e obrigar-me a escrever este pêésse para colocar os pontos nos is. É que a escolha hoje não foi tão boa como isso. Límpido, de cor rubi, espuma vermelha fugaz e com um aroma ligeiro a madeira e a frutos, apenas se bebe. Foi Casaleiro, 2001 mas a um Puro Sangue Ribatejano ainda não chega lá. Pelo preço, bebe-se, não se pode dizer que tenha sido mal empregue. Vou deixar envelhecer um pouco mais as garrafas que me sobram. Talvez no final do ano eu tenha uma opinião diferente.
Escultura

Despiu-a.
Corrigiu-lhe a posição.
Um braço circundava a cabeça
Primorosamente colocado atrás do pescoço.
Ou outro corria-lhe pelo corpo.
Assentou-lhe uma mão sobre a púbis.
Ficou quieta.

O balde do gesso esvaziado sobre o corpo quieto.
Outro balde.
O corpo quieto.
Ainda outro.

O corpo continua quieto
Em exposição.

AF in Livro das Artes
Continua

Pouco a pouco, a historia está a crescer.

domingo, março 21, 2004

Lunch Time Blog

A alface é assim, picadinha. Faz-me lembrar quando a senhora Isabel, está a picar a couve para dar à criação. Só que quando ela está a fazer isso, eu estou sempre com os dois olhos bem abertos, não vá algum galo pensar que tem um competidor por ali. Mas as favas só têm um olhinho e, esse, mesmo assim a gente tira para fora. Depois, o Álvaro e a São é que trataram do entrecosto, dos chouriços, das mouras, dos cheiros. Amanhã quem vai tratar de mim é a Drª Anabela. Vai ser cá um raspanete. E eu ralado. Perdoa-se o bem que sabe ao mal que faz. Mas quando eu lhe disser que acompanhei com tinto do Esporão, a médica vai responder: “Bom, assim está bem!”.

PS. Quando regressamos a casa o Schubert estava a dormir, ao sol, entre o cortinado e a janela. A ele nem lhe perguntei o que almoçou. Seria sobre o almoço dele que ele estava a falar, quando me disse miauuuuuuuuuuuu?
Pesca

O pai pescador, a mãe pescadora, o filho pescador.
O avô pescador também.
O rio e a barragem.
As canas de pesca os anzóis afiados.
De dupla barbela.
Os achigãs, as carpas e os barbos…
Um a um introduzidos na manga.

Fizeram uma caldeirada de avô e avó.
Vazaram a manga na barragem.

Para preservação da espécie.

AF in Livro das Artes
Extractos ao acaso

“Se a mulher está em casa do amante e discute com ele, deve encolerizar-se e abandoná-lo logo. Depois de ele lhe ter enviado o Vita, o Vidushaka ou o Pithamarda para a acalmar e demover, ela deverá então seguir os mensageiros para passar a noite com o amante.
Assim terminam as discussões de amor.”

In KamaSutra, Vatsyayana

É tão bom saudar o regresso da Primavera!

sábado, março 20, 2004

Caça

O pai canibal, a mãe canibal, o filho canibal.
A floresta.
As flechas de pontas envenenadas
Apontavam as presas
Prendiam-nas.
A jovem canibal, ou não, refrescava-se na represa.
Nua, escultural, pura.
O filho acendeu a fogueira.
A água no caldeirão fervilhava.
Comeram a mãe.

À tarde regressaram a casa,
O pai canibal, o filho canibal,
A jovem, nua, escultural, pura
Canibal, ou não.

AF in Livro das Artes
Nunca mais tenho juízo

Eu devo ser meio estúpido. Se só meio estúpido for suficiente para me definir. Tenho a a mania de ler blogs por aqui e por acolá. Logo eu que, como vós sabeis amigas leitoras e amigos leitores, não sou não sou nada de me meter em política, como também não sou nada de me irritar com as análises manipuladoras. Hoje, como sempre o faço, estive uns minutos valentes no Abrupto. E vejo que o José Pacheco Pereira, na sua postagem sobre Manipulação da Informação se insurge contra o que, ele, nos últimos dias, encontrou sobre este tema. Mas li e reli e voltei a ler. E não vi o Dr. JPP, escrever: “Ontem a RTP deu um exemplo claríssimo da sua independência, face ao poder. Se alguém tivesse dúvidas de que a RTP não manipula a informação, ao contrário de algumas outras televisões ibéricas, nem está ao serviço dos partidos do governo, poderia ter dissipado por completo essas mesmas dúvidas. O Sr. Primeiro-ministro foi entrevistado por 4, fixem bem QUATRO, jornalistas e apenas 3, fixem bem APENAS TRÊS, são claramente apoiantes deste governo”. Mas será que eu estava mesmo à espera de ler isso?
Continua

Três "fascículos" já moram.
Lunch Time Blog

Definitivamente aderi à globalização. A minha salada tinha tomate espanhol, alface e cenoura portuguesa, queijo de cabra grego, azeite de oliveira português e ervas aromáticas que não lhes descobri a origem. Depois veio a feijoada de chocos com gambas. As gambas eram de Madagáscar, o feijão branco (ou antes, os porotos alubia, cosecha 2003, origen Salta) eram argentinos e os chocos, sepia sp., vinham em embalagem espanhola. Se toda a globalização fosse assim eu aplaudia. Estava divinal esta refeição de Sábado. O vinho era branco, regional do Alentejo. Mas de vinhos brancos eu não falo. Estava fresco e soube bem.
Hoje fui ao barbeiro… estou tão bonitinho de chapéu novo.

Primeiro era o coxo. Não tenho recordações de muito, muito novo, mas dos meus 6 ou 7 anos, sim. Recordo-me de algumas coisas desse tempo. Ir ao Zé barbeiro era um suplício. Todos o conheciam pelo coxo, porque de facto o era. O Zé barbeiro, não sei se por ser coxo ou por ser barbeiro, odiava cortar cabelos a crianças. Eu acho que não há nenhum barbeiro que goste. Pegava no alicate (alicate sim, para mim era pior que um alicate, era um crocodilo) e toca de desbastar. Mas o Zé barbeiro gostava de mim. Pudera, eu ficava que nem uma estátua. Talvez porque aos meninos que cortavam o cabelo antes de mim, as ameaças de que, “daqui a pouco corto-te uma orelha”, me deixassem aterrorizado. Até que veio a moda dos cabelos compridos. Ufa! Pelo menos livrei-me de metade das idas ao barbeiro. Depois, o Zé barbeiro faleceu. E eu passei a ir ao algarvio. Só ía ao algarvio, porque ficava perto de casa e porque gostava do sotaque. Do corte e do penteado nunca gostei. Depois o algarvio faleceu. Há mais de 30 anos que vou ao Zé Manel. É um vício. Nunca vi nenhum benfiquista como ele. Deve ser o benfiquista que mais mal fala do seu clube. E o que ele se dana comigo, porque eu nunca falo mal do Glorioso. Olhem que nem no tempo do Vale e Azevedo eu conseguia falar mar do meu SLB. E é por isso que a gente se pega. Eu sempre a falar bem do Benfica e ele sempre a apontar-me os erros. Mas porque é que a gente não muda de barbeiro? Agora só quando ele falecer. Ou eu. Ou então quando, no calor da disputa, ele me cortar uma orelha.

sexta-feira, março 19, 2004

Lunch Time Blog

Estais obviamente admirados, amigas e amigos leitores. Eu sei, ninguém me contou, que pelo menos duzentos de vós tereis vindo aqui, hoje, pensando: “deixem-me lá ver o que é que o PreDatado almoçou hoje”. Depois foi a decepção. Este tipo não foi à Bairrada, pensarão alguns. Outros, o que é lhe terá dado para não ter ido comer aquelas amêijoas na cataplana, terá sido o defeso? E ainda aqueloutros, mais drásticos, terão imaginado, só pode ter sido um acidente, o PreDatado teve uma congestão com certeza, ele nunca fica sem sobremesa, pois desta vez comeu um gelado (congelado há mais de 6 meses), tirado daquela montra que abre e fecha em cada 5 minutos e truz, catrapuz, caiu para o lado. Pois alegrai-vos amigas leitoras e amigos leitores. Não foi nada de especial. É que, simplesmente, não almocei. E quem não almoça não tem o direito de escrever um blog à hora do almoço.
Farto de aldrabices e truques de ilusionismo...

Ontem, estive a ouvir uma entrevista na RTP ao sr. Primeiro Ministro. Não sei porquê, lembrei-me de um extracto da peça “Auto da Compadecida” de Ariano Suassuna. Vou reproduzir aqui esse pequeno extracto, em que João Grilo consegue vender um gato que “descome” dinheiro. Aqui em Portugal costumamos dizer “vender gato por lebre”. Nem sei porque me havia de lembrar disto.

JOÃO GRILO
Ah, mas aquilo é porque foi o cachorro. Com meu gato é diferente…
MULHER
Diferente de quê?
JOÃO GRILO
Porque em vez de dar despesa, esse gato dá lucro.
MULHER
Fora vaca, cavalo e criação, bicho que dá lucro não existe.
JOÃO GRILO
Não existe se não… Eu fico meio encabulado de dizer!
MULHER
Que é isso João, você está em casa! Diga!
JOÃO GRILO
É que o gato que eu lhe trouxe descome dinheiro.
MULHER
Descome dinheiro?
JOÃO GRILO
Descome, sim.
MULHER
Essa eu só acredito vendo.
JOÃO GRILO
Pois vai ver. Chico!
MULHER
Ah, e é história de Chico? Logo vi.
JOÃO GRILO
Nada de história de Chico, mas foi ele quem guardou o bicho. Chico!
CHICÓ (entrando com o gato)
Tome seu gato. Eu não tenho nada com isso.
(João dá-lhe uma cotovelada e apresenta o gato à mulher)
JOÃO GRILO
Está aí o gato.
MULHER
E daí?
JOÃO GRILO
É só tirar o dinheiro.
MULHER
Pois tire.

…. Aqui, vou fazer um pequeno salto. João Grilo, por duas vezes, usando artifício de ilusionista, tira dinheiro do rabo do bichano… mais à frente…

MULHER
Nossa Senhora é mesmo. João me arranja esse gato pelo amor de Deus.
JOÃO GRILO
Arranjar é fácil, agora pelo amor de Deus, é que não pode ser, porque sai muito barato. Amor de Deus é coisa que eu tenho, dê ou não lhe dê o gato.
MULHER
Quer dizer que não tem jeito de eu arranjar esse gato?

… Ao fim de alguma conversação a Mulher compra o gato por 500 mil reis ao João Grilo.

Continua

Será que vou conseguir? continua...

quinta-feira, março 18, 2004

Lunch Time Blog

Hoje a minha vontade era de ir ao Leo. O Leo é um restaurante em Setúbal onde o prato principal é choco frito. Existem outros, mas eu tenho por hábito ir ao Leo. Já comi choco frito em quase todo o litoral português, do Minho ao Algarve. Nunca comi igual ao que se come em Setúbal. Não lhe conheço o segredo tendo mesmo tentado cozinhá-lo em casa, por mais de uma vez, sem nunca ter acertado na fórmula. Sejam grandes os pedaços, sejam pequenos, sempre “al dente” como soi. Gosto de o comer na esplanada, acompanhar com salada mista de tomate e alface e um bom vinho branco. Fresquinho. Eu não sou um amante de vinho branco, mas com aquele prato cai bem. Levantei-me, fiz a barba, lavei os dentes, tomei um café, fumei um cigarro, li uma meia dúzia de blogs, voltei à casa de banho e água? Nem uma gota nas torneiras. Esperei até quase à uma da tarde, pois sem banho meus amigos, santa paciência, mas não saio de casa. Fiquei-me pelos lombinhos de porco preto. Mas vinguei-me. Reguei a refeição com uma Herdade de Espirra, 1999, DOC. Excelente.


PS. Eu sei que estão todos perguntando: e então o Schubert? O Schubert comeu a sua ração para gato bebé e o leitinho. Espero que nunca me obrigue a partilhar o Herdade de Espirra com ele. Era o que mais faltava… um gato besanas.
Ontem fui lá

É indescritível. Durante mais de 10 anos tive um lugar cativo na Catedral. Mesmo no último, em que eu sabia que não iria usufruir, a tempo inteiro, da minha cadeira, eu paguei o meu lugar. Queria, é certo, tirar algumas vantagens, pois saberia assim que seria dos primeiros a ser convidado para um lugar na nova. Mas a vida tem destas coisas e não me senti, nem com coragem, nem com disponibilidade mental (e material, diga-se de passagem) para pagar a exorbitância que me era exigida, para reservar um lugar no novo estádio. E digo bem, reservar, pois para assistir aos jogos eu teria sempre de adquirir o respectivo ingresso. No antigo, o preço do lugar incluía também o valor da entrada. Não era barato mas era acessível. Por isso eu fiquei triste e fui resistindo, resistindo, resistindo. Mas ontem fui lá. O resultado era importante, sem dúvida. Gosto que a minha equipa ganhe sempre, sabendo eu quão difícil o é nos tempos que correm. Mas eu não fui só ver o jogo. Fui ver a Nova Catedral. É indescritível. Vocês, amigas leitoras e amigos leitores, mesmo que nada os ligue ao Glorioso, precisam ir lá ver. Depois não descrevam. Retenham apenas na memória.
E agora algo completamente diferente

Hoje acordei com vontade de escrever a sério. Vamos ver como me vou sair desta. O 25 de Abril fará este ano 30 anos que aconteceu. Apesar da pompa e da circunstância que as comemorações oficiais irão, pela certa, ter, a memória já é quase só de alguns. Em anos anteriores aborreceu-me ao ver na televisão e ler em jornais um conjunto de entrevistas aos mais jovens, àqueles que nasceram já depois do 25 de Abril de 1974, a ignorância demonstrada sobre o que foi. Tão mau como não saber o que aconteceu no 25 de Abril, é também a percepção do desconhecimento do seu enquadramento. Nessas entrevistas a certos jovens cheguei a ouvir respostas arrepiantes do tipo, “o 25 de Abril foi uma revolução para o Marcelo Caetano derrubar o Salazar”, “Pide? Não nunca ouvi falar”, “parece que havia um regime comunista do Salazar que a esquerda quis derrubar”, “havia uma guerra entre Portugal e Angola e então deu-se a descolonização em 25 de Abril”, entre outras aberrações. O que vou escrever nos próximos dias, e espero que não me falte a inspiração, não pretende explicar o 25 de Abril a ninguém em geral. É para oferecer a duas pessoas em particular. Aos meus filhos, à Ana – 22 anos - e ao João – 19 anos – que, obviamente, nasceram depois do 25 de Abril. E embora eles o saibam, porque várias vezes temos conversado sobre isso, cá em casa, talvez sirva para mais tarde eles, ao relerem, os ajudar a explicar o que foi aos seus próprios filhos.
No entanto o Predatado não irá ter qualquer alteração aos seus hábitos de escrita de coisas comuns do quotidiano, do jeito que eu mais gosto de fazer. Por isso decidi criar uma outra página onde a “estória” que vou contar irá evoluindo ao longo dos dias. Chama-se Livro De Contos e está aqui nesta morada. Se o engenho me permitir continuar depois de terminado o meu conto sobre o 25 de Abril eu continuarei a romancear. Se a imaginação ou o enfado me atacarem, eu fecharei o sítio. Para já comecei hoje, depois se verá.

quarta-feira, março 17, 2004

Vinte e seis

Há mais de duas décadas que fazemos um almoço comemorativo da nossa licenciatura. No entanto, ultimamente, a malta tem andado muito relaxada. O ano passado quando toda a gente estava à espera que fizéssemos a comemoração das bodas de prata, a comissão organizadora, que nem sei se estava nomeada, baldou-se. Então eu e o Artur decidimos que, mesmo sem comissão, deveríamos ser nós a organizá-lo. Vós sabeis amigas leitoras e amigos leitores que eu não sou nada, mas nada mesmo, de vos fazer ler coisas com as quais vós não vos identificais. Normalmente só escrevo sobre os grandes problemas de Portugal e do Mundo como, por exemplo, as cheias lá na minha rua, durante o Inverno, porque os ralos de escoamento das águas pluviais nunca são limpos a tempo e horas, da sandes de presunto que se come no Zé Luís e outras coisas assim transcendentes para quem vive neste pobre planeta de águas, um pouco por aqui e acolá, ainda azuis. Mas caramba, não é preciso levar a coisa sempre assim tão a sério, e de vez em quando usar este blog para coisas exclusivamente privadas também não é coisa para se levar a mal. (Escrevi entre coisas e coisa uma data de vezes, mas fica mesmo assim, senão a coisa não soa bem). É assim que vos anuncio que serei eu e o Artur a organizar o tal convívio dos 26 anos. E porquê 26? perguntarão as minhas leitoras e os meus leitores. Até parece que vos estou a escutar em uníssono a fazer a tão fora de propósito pergunta. Ora ele há boas razões. È por ser um número redondo. Exactamente! Não é uma dezena, nem uma dúzia. Não é um quarteirão, nem uma centena. Não é o 5º, nem o 10º, nem o 15º, nem o 20º, nem o 25º, nem por aí fora. Nem vinte e seis é um número primo! Nem tão pouco é 3 vezes 9 e por mais estranho que vos pareça se lhe tirarem a prova dos nove não dá noves fora nada. Dá 8. E oito é um número redondo. Duplamente redondo.
Lunch Time Blog

Por mim, ele trabalhou num lagar de azeite. Ou então foi pescador. Virou-lhe o capelo e o bicho ficou do avesso. Deu-lhe um pequeno entalão que é como quem diz, um banho de água a ferver. Depois no carvão aquele toque de quem grelha o que antes parece cozido. As batatas não combateram com Cassius Clay, mas os murros foram dados à maneira. Regado com azeite puro de oliveira, onde o alho fora previamente alourado, uma cebola às rodelas sobre o polvo. Polvo à lagareiro. Não sei se é um prato típico português. Mas o cozinheiro é.
Banal / humilde

O nome do blog é esse. Homem Banal. Eu acho que é humilde, por se considerar banal. Leiam como ele escreve e depois digam-me. E não é publicidade gratuita. Bom, é gratuita mesmo, porque não passo recibo. Experimentem ler e vejam se eu não tenho razão. E depois fico aqui a pensar que o Pipi é que vende livros. Com direito a reportagens fotográficas e a links de tudo quanto é cantinho. Para ler pornografia barata. Barata não, parece que o livro até é caro. Mas adiante que essa não é minha praia
Fintas

Ontem tivemos visitas. A casa estava cheia e isso para o Schubert foi novidade. Há-de acostumar-se porque o dono não é nada de ter a casa vazia, como aliás vós sabeis amigas leitoras e amigos leitores. Nada mesmo. Se o dono do Schubert pudesse, estaria sempre em festa. E para o Schubert cada um desses dias seria dia de demonstração de novas habilidades. A minha ciática é que iria piorar de certeza. È que eu também ando de gatas a brincar com ele. E o Figo que se cuide, pois ontem, aprendi com Schubert a fazer umas fintas novas. Só falta aprender a rematar à baliza. Mas isso é outra história. Vou hoje ver o Benfica para ver se aprendo… ou não

terça-feira, março 16, 2004

Sobremesa (II)

Encaro-a. Primeiro observo a cor.
Aprecio mais sua tez escura,
E, quando lhe toco, sentir brandura.

Vê-la clara, acalma-me o ardor
Com que pedi para me a trazer.
Recuso-a. Que mais posso fazer?

Por mais que digam que é bom,
Tem de haver uma maneira,
Para a gente perguntar
(Sem parecer de mau tom),
Antes de ela chegar…
A vossa mousse é caseira?

Alves Fernandes in Sobremesas
Lunch Time Blog

Porco. Javardo. Suíno. Nas palavras cruzadas chamam-lhe Tó. Bácoro. A cabeça, a faceira, a pá, a unha, o chispe, a entremeada, a rabadilha, o ganso, o entrecosto, a banha, o torresmo, o lombo. Aquela massa de pimentão. Os alhos, o molho, o pão a molhar no molho. Os triglicémios a subirem em flecha. Hoje preferi-lhe as costoletas. São dias.
A papoila

Como vós sabeis, amigas leitoras e amigos leitores do meu blog, eu não sou nada de escrever longas postagens. Nada mesmo. Esta minha opção é porque, vós, caríssimos leitores, se quiserem ler histórias mais compridas sempre podem comprar um clássico, como o Capuchinho Vermelho (que até tem um lobo) ou a Bela Adormecida (que até tem uma Bela), ou em alternativa ir ler o blog Mesa e Quintal. Mas hoje eu vou abrir uma excepção, quem quiser lê, quem não quiser perder muito tempo, salta à frente. De qualquer forma, sinto-me muito lisonjeado por pararem neste cantinho. E porque é que eu decidi escrever este post? Pois! Por causa da papoila. No Larousse diz assim: s.f. planta herbácea com flores vermelhas de pétalas caducas, erva daninha comum nos campos de cereais (família da papaveráceas gén. Papaver). Ora eu achei tão pouco. Ainda por cima daninha hein? Não me contentei, e corri atrás (este brasileirismo deu jeito). Foi então que descobri que existem uma série de sabonetes à base de papoila, cuja tabela com os respectivos preços eu passo a divulgar:

PAPOILA ADRIANA 93,30 €
PAPOILA ARGENTINA 66,64 €
PAPOILA BAIANA GRANDE 39,98 €
PAPOILA BAIANA PEQUENA 53,31 €
PAPOILA CIPRESTE 33,32 €
PAPOILA CIPRESTE PEQUENA 33,32 €
PAPOILA GABRIELA 106,62 €
PAPOILA INDIANA 66,64 €
PAPOILA NEMÉSIA 66,64 €
PAPOILA PORTUGUESA 53,31 €
PAPOILA TINHORÃO 66,64 €


Não me perguntem se é ao quilo, aos centos, à unidade, às caixinhas, que eu também não sei. O que sei é que cheiram bem.

Depois fui por aí fora, e encontrei uma planta autócne de Cabo Verde : Papoila-de-Cabo-Verde; Papaver gorgoneum Cout. ssp. gorgoneum (Papaveraceae)

Não sei se deveria… mas… vocês amigos leitores e amigas leitoras desculpar-me-ão, pela certa, temos também a do ópio:

O ópio é constituído pelo suco ou latex solidificado da papoila dormideira (Papaver Somniferum). Este latex contém cerca de vinte alcalóides que incluem a morfina, a codeína, a tebaína e a papaverina. As propriedades desta planta são conhecidas há milhares de anos e podemos encontrar relatos da sua utilização para fins medicinais e de simples prazer em documentos das antigas civilizações suméria, egípcia, grega e romana.

Por fim e porque a postagem já vai longa, descobri no Projecto Vercial este poema de José-Emílio Nelson, nascido em Espinho em 1948, que com o devido respeito transcrevo:

A TÁBUA DA PERFEIÇÃO

A melhor papoila é o ícone, meu filho.
As pétalas desdobradas e o ouro talhado
pela boca a prepará-lo, mas íntima
é a papoila, rasteira, frágil, a haste-unha de um único dedo,
a que enlaça e culpa o vento,
grácil, singela, a que piso com a urina da viagem,
a que amarroto e seco nos papéis (quando não
artificial, coisa de fumos, que escurece
em pó).
E o que é, disse-me ele, é que
a papoila mantinha-se a latir
quebrada (e o meu pai a tropeçar, disse-me,
imperioso, - ocorre-me dizer, repetia, amalgamava,
(a difamar-se,) aparecia a amaldiçoar, obcecado, a pétala
(prosseguiu as alegações,
inicialmente com tédio, empertigado, com lástima).
– Deita o lixo e a agonia na arrecadação (ele passeou, murmurava, a
anular desastradamente a sujidade daquela minha decência).
Tratava-se de iluminar a retumbante beleza, para ele, da resignação,
num manuscrito com esmaltes que sobressaem no emoldurado
da tábua da perfeição.
(in Mosaico)


Por tudo isto, mas principalmente por nada disto vale a pena ler o blog da papoila.

PS. Entre pites, funcho, anis, cinco em rama, malmequer, laranja, aveia, cardo, atabua, castanheiro, salva, limoeiro, carafeteiro bravo, tulipas do campo, eucalipto, morangueiro, giesta, grama, hera, macela, erva de S.. João, lírio bravo, nogueira, tojo, rosmaninho, milho, malva, mirtilos, sobreiro, roseira, brava, alecrim, silva, framboesa, giesta, dente de leão, urtigas, violetas do campo e tantas outras, a papoila pode também ser encontrada no nosso Alentejo. Esta papoila de que vos falo poderá ser encontrada aqui.
Dúvidas dos leitores

Recebi de um estimadíssimo leitor deste blog um e-mail bem simples que me colocava uma pergunta, para o referido leitor, assaz pertinente.
Perguntava ele: “Meu caro PreDatado, porque é que nos enfada com a descrição dos seus almoço?”
Bom, eu nem imaginava que os meus Lunch Time Blogs eram enfadonhos. Juro que não. Mas eu passo a explicar.
Há alguns anos atrás, fui indicado como testemunha num caso, que não vos vou enfadar a descrevê-lo. Às tantas, o Juiz fez-me uma pergunta que eu achei completamente irrelevante para o item, sobre o qual eu testemunhava. Nessa altura respondi: “Com a devida vénia Sr. Dr. Juiz e com todo o respeito por V. Exa, eu já nem me lembro o que almocei ontem, quanto mais esse facto passado há mais de cinco anos”.
Foi o suficiente para a partir dessa data, anotar religiosamente num caderninho todos os meus almoços e jantares. Agora o meu caderninho é este blog. Está explicado. Ah já me estava a esquecer de vos informar que no dia 16 de Março de 1999, almocei, Sopa de Cação e de sobremesa, uma Encharcada. Sim, porque eu nunca dispenso a sobremesa.

segunda-feira, março 15, 2004

Lunch Time Blog

Quando os vejo aos saltinhos pelas veredas, na sua graciosidade, parado aqui e ali, para comer mais um rebento de oliveira, ou uma letuga sobressaída no meio do campo, chego a parar chamá-los e eu próprio pegar numa erva qualquer e lhes dar à boca. Depois passo-lhes a mão pelo pêlo, dou uma carinhosa palmada e mando-os ter com a mãe que, de ciúmes ou cuidados, berra. Se os visse morrer, ou serem mortos, de certeza uma lágrima me escorreria pela face. Mas quando olho para o cardápio e leio “cabritinho no forno com batatinha assada”, não penso mais nisso. Que crueldade! E agora digam se «…é preferível ver um cano de esgoto em toda a sua porcaria a uma alma em toda a sua intimidade.», a frase que eu transcrevi ontem é ou não aplicável.
8 Anos…

Como vós sabeis amigas leitoras e amigos leitores eu não sou nada de me meter em assuntos da educação. Muito menos das escolas estrangeiras e, já agora, ainda muito menos nas escolas espanholas. Se eu fosse dessas coisas, teria que afirmar aqui que as escolas superiores de comunicação social em Espanha devem ser das melhores do mundo. Elas conseguiram nestes últimos oito anos obter resultados quase impossíveis de obter em outras escolas do mundo. Ou seja, não só a formar mas mesmo a amestrar, pós-graduar e doutorar em manipulação. Eu já afirmei aqui antes que sou um bloguista leitor de primeira apanha. Corro Seca e Meca na blogosfera para apreender e até aprender. E como sou muito eclético nas minhas leituras (vejam que tanto faço um link ao bde, como ao abrupto), tive oportunidade de ver a quase unanimidade das opiniões dos blogs políticos de direita sobre o resultado das eleições espanholas: O PSOE ganhou porque os mass media manipularam. Ora, há 8 anos atrás o PP ganhou e há 4 anos também. Nessa altura OBVIAMENTE os mass media não manipularam. Como se aprende tanto em tão pouco tempo em Espanha… não é?

domingo, março 14, 2004

Lunch Time blog

Depois de uns choquinhos grelhados en su tinta, aquela salada de tomate, que ela tão bem tempera, com uma rodela de cebola fininha e orégãos, um bom Beaujolais, os morangos e o café que mais eu quero? Quero ir dar um passeio à Costa da Caparica, desfrutar o sol, cheirar o mar, fazer tempo para que o pôr-do-sol chegue, ouvir Milton Nascimento… depois compor um poema que fale de amor.

PS. O Schubert hoje já me deu duas dentadinhas. O bichano gosta de brincar assim, o que posso fazer? Eu não sou uma Whiska…quanto muito sou um Friskie.
Há dias em que eu estou assim…sei lá

Estava, esta manhã, a arrumar alguns livros que tinha por aqui e por ali, quando no meio da desordenação me veio parar às mãos um velho livro em 5ª edição, 12º milhar, cuja edição é de MCMXVII (a primeira edição é de 1905). Quem mo ofereceu escreveu, entre outras coisas, na dedicatória:
“Bom amigo V…,
Na hora da tua partida, quis oferecer-te a cartilha por onde estudaram alguns dos teus algozes…”.
Decidi folhear um pouco e transcrever uma pequena passagem:

“ … É preferível ver um cano de esgoto em toda a sua porcaria a uma alma em toda a sua intimidade. Há almas cuja treva é maior que a noite, consciências cuja lama é maior que a de todos os pântanos da terra.
Cada homem dissimula em si um trágico Carnaval. Murger disse algures que a Vida era «uma mascarada de forçados». E se pudesse fazer cair a máscara que cada um afivela recuarias de terror.”

Albino Forjaz de Sampaio in Palavras Cínicas

Se este livro não estivesse datado eu diria que tinha sido escrito hoje.

sábado, março 13, 2004

Sobremesa (I)

Tenho com ela uma atitude nobre.
Suavemente, a rugosa veste retirando
Retribui-me essa nobreza, me mostrando
O véu sedoso que seu corpo cobre.

Espera de mim um pouco mais de aprumo.
Não a defraudo e, como se fora mestre
Dispo-a então dos restos que se veste
E já nua, chupo seu delicioso sumo.

Mas nem sempre esta atitude tomo
Gosto de a comer de feição diversa
Por isso a abro muitas vezes em flor.

E, egoísta, a seus gomos eu assomo.
(vou ser directo, deixemo-nos de conversa)
Sou louco por laranja, mas detesto a cor.

Alves Fernandes in Sobremesas
Lunch time blog

Vestiam de prata. Os seus olhos bonitos e brilhantes. O sangue ainda lhes escorria fresquinho. Ao seu lado, noutro compartimento, uns familiares tinham passado mal a noite. Os olhos avermelhados e os fatos amarrotados mostravam que de ontem para hoje algo não lhes tinha corrido bem. Optei pelos primeiros. Um a um, foram dando entrada na caixa que os transportaria. Eram lindos… deveriam se como manteiga.
Em casa misturei o alho bem picadinho, com a cebola e salsa também picadas. Um pouco de colorau, um pouco de pimenta, o azeite e o vinagre. Estava preparado o molho.
A grelha já estava quente. Os carapaus prateados pareciam pedir: “venha de lá esse calor, homem. Já passamos frio demais hoje”.
Quando vieram para o prato, estavam secos. Nem o molho os safou. Não sei se foi a vingança do carapau face ao meu voraz apetite. Foi um desconsolo.

sexta-feira, março 12, 2004

Madrid

Já anteriormente o afirmei. O meu blog não é político. Aderi a este espaço da blogosfera como um facilitador da minha vontade diária de escrever. Poderia, como o fiz ao longo de vários anos, escrever em páginas de Word, depois imprimi-las ou gravá-las num disco e finalmente dar-lhes o destino que sempre lhes dei ou seja, guardá-los numa gaveta. Se utilizo, agora, este espaço é porque achei interessante partilhar com alguns amigos, alguns conhecidos e alguns outros visitantes que tivessem paciência para o ler, algumas das minhas vivências, dos meus desabafos, das minhas opiniões, dos meus gostos e até das minhas banalidades. È, por isso, que este blog não tem uma especialidade. Não tem um carácter político, nem desportivo, nem cultural, nem de discussão pública. Talvez também por isso tenho resistido, até agora, depois se verá, à tentação dos “comentários” por não ver neste blog nenhum interesse de debate público. No título inclui o meu e-mail para que, no caso de alguém se interessar por algum dos textos, me questione, me sugira ou até quiçá, me cumprimente. Mas pelo facto de o meu blog não ter as características que anunciei, não é desprovido de cabeça. E é aqui que eu opino sobre coisas do mundo vistas por mim ou vistas pelos outros. E quando os outros as vêem de uma forma diferente do que eu as vejo, sinto-me no direito, que não na obrigação, de concordar ou discordar publicamente. È para reunir mais conhecimentos mas também para perceber o pensamento ou a maneira de ver dos outros que, eu, todos os dias, dou uma pequena volta pelos mais significativos (ou pelo menos os que para mim me parecem ser mais significativos) blogs da blogosfera nacional. Entre as minhas visitas diárias conta-se o Abrupto, um blog de José Pacheco Pereira, que na sua vertente cultural me tem ajudado a conhecer melhor alguns poetas, alguns pintores, alguns pensadores. Porque eu não me fico apenas pela leitura circunstancial, as referências dadas nos blogs são normalmente, sempre que a disponibilidade de tempo me permite, acompanhadas de uma pesquisa um pouco mais aprofundada dessas referências. No entanto, quando os blogs se apresentam de características mais ou menos ecléticas, sempre haverá um ou outro aspecto em que o especialista, eventualmente, mete o pé na poça, como soi dizer-se. E é exactamente quando o Abrupto emite algumas opiniões políticas, que eu acho que o Dr. José Pacheco Pereira deveria ser um pouco mais intelectualmente honesto. Ontem, a minha primeira visita aos blogs, foi exactamente ao Abrupto. E nele mais do que a condenação aos nefastos e sanguinários acontecimentos de Madrid, foi a acusação aos seus, na opinião do Abrupto, autores: a ETA.
O Dr. José Pacheco Pereira, tem não só todo o direito de ser contra a ETA e de o escrever, mas também essa obrigação. Nenhuma organização terrorista deve ser poupada pelos amantes da liberdade, da democracia e da paz. Mas o Dr. José Pacheco Pereira teve, tem e infelizmente terá, toda a oportunidade do mundo para se insurgir contra a ETA. E quando o fizer eu subscrevo-o publicamente. O que não tem é o direito, de, oportunistamente (lembrem-se da proximidade das eleições em Espanha e de como um atentado da ETA, neste momento reforçaria a posição do actual partido no poder e de como os portugueses, com um fazedor de opinião que nem José Pacheco Pereira, se colocariam rapidamente do lado dos apoiantes – leia-se coligação CDS/PSD – do PP espanhol) atribuir o atentado à ETA, quando nem a própria opinião publicada nos mass media espanhóis o fazem peremptoriamente. Para os que morreram não é importante saber se foi a ETA ou a Al Qaeda quem os matou. Mas para os que cá estão, isso não é uma minudência. Não sei se é politicamente correcto dizer isto, mas Deus nos livre de que tenha sido a Al Qaeda. Sob o ponto de vista da ameaça à paz mundial, para mim seria bem pior confrontar-me com o facto de termos a Al Qaeda a vingar-se dos Cruzados do que serem os etarras a fazerem o que melhor sabem fazer - assassinar. È que a minha solidariedade para com as vítimas e familiares das mesmas nos atentados de hoje, não me retira a preocupação de que hoje eles, quiçá amanhã nós. Não podemos esquecer que Durão Barroso integrou essa mesma cruzada.


PS. Ao contrário do que li em outros blogs, que sugeriam que a blogosfera deveria eliminar os links ao Abrupto, eu não penso da mesma maneira. Pelo contrário. Hoje mesmo decidi incluí-lo na minha lista. O Abrupto, felizmente para mim, não é só opinião política.

quinta-feira, março 11, 2004

Sem vontade

Hoje estou sem vontade para escrever... os acontecimentos de Madrid, deixaram-me perturbado. Pode ser que mais logo me recomponha.

quarta-feira, março 10, 2004

Gramei pah

Oh pah a sério. Gramei mesmo. Gramei o post Este Blogue do maradona (com minuscula). Por quase tudo o que diz. Ele não tem problema nenhum em dar graxa, diz ele, mas eu tenho pah. E por isso oh maradona (com minuscula) isto não é graxa. A sério. Você até diz que o blog é anti-benfiquista primário e logo eu que sou lampião de corpo inteiro (sim, inteiro, não tenho nenhum partido) até gramei. Continue a ser pah. É que tenho alguns contras é em relação aos secundários. E finalmente, sem brincadeiras, gostei do seu post, maradona (com minuscula).
Contos II

Os autócnes tinham um ar fúfio. As gaforinas não ajudavam à criação de uma imagem menos depreciativa. No entanto os pescoços exibiam fulgentes colares de estranho metal. Ensaiaram uma ginga em meu redor e tentaram comunicar. Não sei se por ter acordado no momento os sons que emitiam eram-me ininteligíveis. A última vez que tinha escutado algo similar, foi de uns indígenas de Timor Oriental que tentaram ensinar-me o seu galóli. Tive medo que se tratasse de antropófagos preparando a funçanata. Num pequeno hiato de tempo, um deles de aspecto galhardo, apercebendo-se de que eu efectivamente não estava atinando com o seu linguarejar, ensaiou uma ideografia simples mas eficaz. Aí eu não tive coragem para ilidir. Aceitei de imediato. Era um convite para repasto. Seria?

Continua…

PS. Para quem não está a seguir a história aconselho a leitura de Contos I, publicado em 05 de Fevereiro. Basta ir aos arquivos.
Lunch Time Blog

Estou quebradinho. Hoje foi dia de Cozido à Portuguesa. Enchi o bandulho e depois? Depois, vós tereis de reconhecer que assim não vou perder o peso que a minha médica, a minha fisiatra e o meu endireita-acumpunctor me pediu para perder, a modos que a minha coluna sofra menos. (E também o meu cardiologista e o meu endocrinologista, mas estes é por outras causas). A ciática ataca ao amanhecer, poderia ser um bom nome para um filme ou para um livro. Mas aí eu teria de ser bem mais produtivo, tipo, a ciática ataca ao entardecer, a ciática ataca ao anoitecer, a ciática não me larga a peúga, ou mais vernaculamente, já não sei que fazer a esta f.d.p. de ciática. Mas não é só isso. Amanhã já não posso ir fazer as análises. É que vou enganar o colesterol ou não é?

PS. Vós sabeis, amigas leitoras e amigos leitores que eu não sou nada de fazer pêésses que tenham a ver com os textos que escrevo. Mas hoje não aguentei. È que eu gosto tanto, mas tanto, da palavra bandulho!

terça-feira, março 09, 2004

Eu e a música

Existe em mim uma profunda relação entre a música e a lágrima. Não posso escutar um fado português (existe outro?), um tango argentino (existe outro?), um flamenco espanhol (existe outro), uma folksdans sueca (eu sei que existem outras) que não desate imediatamente a chorar. Pois é, nem tenham dúvidas, mas eu ainda não disse tudo. Eu, como todos vós sabeis, amigas leitoras e não menos amigos leitores não sou nada pieguinhas. Aposto que nenhum de vós me viu andar por aí a chorar nos cantos. Mas sou assim mesmo. A música dá-me uma enorme vontade de chorar. Pois bem, eu estava por aqui blogueando, que é como quem diz, aos saltinhos de blog em blog, como o carapau aos saltinhos de nenúfar em nenúfar sempre que quer atravessar o rio de um lado para o outro, sem sofrer da síndrome da bicha da ponte, quando deparo com o blog da bomba inteligente a apontar-nos a setinha para a grafonola. E não é a primeira vez que ela faz isso. E eu que deveria estar, ou a pensar (eu reflicto muito no que leio, vós sabeis, não é nenhuma novidade), ou a rir (eu rio das piadas a que vulgarmente chamam anedotas e das anedotas ou dos anedotas que opinam a torto e a direito sobre todos e sobre tudo, qual Nuno Rogeiro… adiante), ou então, simplesmente, a passar tempo quando leio blogs assim tipo este, dou por mim a chorar baba e ranho. E agora numa completamente a sério: sabem porque é que eu choro? Quereis saber? Perguntai: Porque é que choras PreDatado? – “Porque é que choras PreDatado?” – Então eu vou responder. Eu não choro só quando escuto as músicas que enumerei. Eu choro quando ouço qualquer música, por mais alegre que ela seja. Choro de desgosto por não ter jeitinho nenhum para as notas. Se me pedirem para cantar logo a seguir, eu já não sei. Se me pedirem para acompanhar eu desafino. Não é mesmo para chorar?

PS. Depois disto só me resta colocar um sertanejo, um luar de sertão, ou melhor estava-me a esquecer. Vou ouvir o Tony Silva a cantar música ró. È de ir ás lágrimas.
Apresados Sen Presa

Abrir a boca en ti, onde as estrelas
configuran a constelación dos nosos nomes,
abrandar a vontade que nos puxa
implacabelmente para os extremos opostos
con esa forza de non sermos nen eu ti nen ti eu,
cortar a fita para inaugurar o tempo
no que nos miramos o ollo no ollo multiplicado
como o rio aquel, o suor, o beixo continuado
balizado por latexos que se escapan,
e palavras atadas que nos fican dentro,
para fabricar o xesto de buscar-nos
por debaixo das sombras e os vestidos.
Abrir a boca à escuridade para encontrar o dia.


Luisa Villalta, escritora galega, faleceu no passado dia 6 de Março, aos 46 anos de idade.
Ai os nomes!

Quase toda a gente se queixa do trânsito, das filas incomensuráveis. Eu dou graças a Deus. Não fossem as bichas para a Ponte 25 de Abril e eu não estaria informado, nem metade, do que estou hoje. Agora já não são só essas. As obras do Metro do Sul do Tejo, têm provocado bichas tais que, de Almada a Corroios (3 kms), se demora bem uma horita. Abençoada bicha! Ontem enquanto percorria esta “via-sacra”, tive a oportunidade de escutar quase toda a entrevista no programa Conversas Pessoais e Transmissíveis da TSF com Onésimo Teixeira de Almeida. Entre muitas outras coisas falou-se de humor. Das três principais teorias, Aristotélica, Kantiana e Freudiana, sobre o humor e, de como o referido escritor e professor universitário, actualmente, encara a compra de livros sobre estas teorias. Diz ele que conhecendo profundamente este tema acaba por comprar os livros apenas para descobrir no meio deles, uma anedota nova. Não deixa de ser curioso. Mas também se falou de nomes. E de Onésimo obviamente. Não sendo normal nos EUA, colocarem-se acentos nas vogais, o seu nome acaba por escrever-se Onesimo, sendo até que uma vez, contou ele, viu-se aflito para perceber que era ao Sr. Onésimo que estavam a chamar, quando chamaram Mr. One Simo (Uane Saimow).
Esta história fez-me lembrar uma outra. Uma vez, num estágio que fiz na Califórnia, indicaram-me que a minha orientadora seria a Jenny Freitas… Assim mesmo (Dgéni, Freitas). Na manhã seguinte procurei nas plaquinhas de cada biombo, no imenso open space, a minha conterrânea Freitas. Até que eureka, lá estava a Jenny Fratus. Sim Fratus, qual é a admiração? Eu explico. O avô da Jenny era um minhoto, António Freitas, de sua graça, a quem os americanos chamavam, sempre que viam o nome dele escrito, de Mr. Fritéze. Ora o homem, era Freitas e não Fritéze. E como poderia ele manter a descendência Freitas? Simples, obrigar a que os seus filhos e, posteriormente, os seus netos, tivessem um nome que os americanos, por mais imaginativos que fossem ou arrevesados na pronúncia, não deixassem de lhes chamar Freitas. Assim nasceu um novo apelido Fratus, que à maneira americana se leria Fra (frei) tus (tas). Imaginativo o nosso amigo António, não?
Só espero que quando um americano (ou inglês, tanto faz) escreva a lista dos melhores jogadores de futebol de todos os tempos não substitua o nome do nosso Figo (faigow), por Feegw, apenas para se poder ler em português. É que mesmo que soe bem, tem cá um mau aspecto!
Cof...Cof...Cof...

Sempre que leio uma banda desenhada e o autor quer pôr alguem a tossir, é assim, como neste título que ele escreve. Eu que tenho (tinha) uma tosse desgraçada sempre num misto de uma constipação eterna e de um eterno vício cigarral, não acredito nada em xapores para a tosse. Pelo menos desde que li (ou vi na TV) já não me recordo, uma notícia em que a maioria dos xaropes à venda em Portugal, dizia-se, tinha apenas um efeito placebo. Mas há horas para tudo, e como a tosse não me abandonava, cada vez mais forte nos últimos dias, ontem resolvi pedir à minha médica um xaropito que ajudasse a aliviar este meu, já bem transtornado, peito. Quando fui ler a literatura inclusa, não encontrei nem contra indicações, nem composição quimica, nem quase nada do que é habitual. Reparei apenas que se tratava de um medicamento homeopático. Aí eu desconfiei. Eu não sou nada, mas mesmo nada, como vocês bem sabem amigas leitoras e amigos leitores, de tomar remédios por dá cá aquela palha. Mas desta vez tomei. E não é que ao fim de dois dias estou bem mais aliviadinho? Ele há com cada placebo...

PS. Não vos tenho dado notícias do Schubert. Sei que estão ávidos de informação. Pois é, o Schubert está cada vez mais engraçado. Ontem filmei-o. Quando eu souber coloco-vos aqui um mini-clip do bichaninho.
Recordações do Alentejo

Que lindas eram as águas do Guadiana
Recordas-te ainda do medo
Que tinhas das cobras de água?
E nós na margem,
Onde a pesca era só um pretexto
Para estarmos ali.

E ao poço, as viagens eram longas,
Embora pouco mais de cem metros
E duas enfusas só para encher?

Que os olhos da mãe não podiam
Ser testemunha.

E a cumplicidade das estrelas
No céu limpo de Agosto?

E as quentes, abrasadoras tardes
Em que fingíamos dormir
E nós, acariciava-mo-nos, sós
Na escuridão do quarto interior?

Alves Fernandes, in Amo-te

segunda-feira, março 08, 2004

1857 - 2004

Violência doméstica.
Excisão do clitóris.
Burka.
Véu Islâmico.
Catarina Eufémia.
A grávida e o trabalho.
Assédio.
Praxe académica.
Violação.
Salário desigual.
Tráfico.
Criminalização no aborto.
Aung San Suu Kyi.
Poder e decisão.
Ordenação católica.
Lilis, Kikis, Kakás, Bibás.
Escravatura.
Luísa sobe, sobe que sobe, sobe a calçada.

Fim-de-semana

Churrasco misto, pezinhos de coentrada, cabidela de galinha do campo, Festival de Peixe do Rio, um passeio à tapada da Mina, vinho tinto, o jardim com a relva cortada, uma rede cerarence, o canto dos pássaros e os silêncios, o balir das ovelhas e os guizos, o luar lindo, lindo como só o do Alentejo é, justificam esta ausência de dois dias.

sábado, março 06, 2004

Enquanto eu puder sou vício

Fumo, que de fumar me agonia.
Jogo (porquanto o dinheiro dê),
O fundo da garrafa já se vê,
Que deixar-lhe gota, não podia.

Bebo café - uns dez por dia.
Passo horas diante da TV.
Devoro livros, como quem não lê,
Exagero no riso. Haja alegria!

Até o rádio alto, o som transmite,
Deliro viver em extremidade,
Tanto quão a vida mo permite.

E não fora, eu ter esta idade
Faria amor, sem ter limite.
Exageraria até á eternidade.

Alves Fernandes in Amo-te

sexta-feira, março 05, 2004

Tenho o meu PC de volta

Não sei se estais recordados, mas em 22 de Janeiro referi aqui que o meu HD tinha dado o bafo e que depois de o entregar na loja, teria ido para o representante para ser reparado. Pois bem, hoje está de volta. Não achais que foi rapidinho? Daaahhh.
O meu e-mail (I)

Quase toda a gente que eu conheço recebe e-mails com muito interesse. Infelizmente devem ter confundido o meu e-mail com o Recycle Bin do Windows ou qualquer outra trash box que quando o S.O. pergunta: “Tem a certeza que quer enviar este documento para o lixo?” , do outro lado da pantalha devem responder “Não! Vá directamente pró e-mail do PreDatado”. Só pode, não é? E é por isso que eu já quase nem os leio. Mais de 75% eu “dilito” de imediato. Mas de vez em quando lá vou abrindo um ou outro. E ontem recebi este com muita graça. Dizia-me uma amiga minha que tinha encontrado no super mercado lá da cidade onde vive, uma nova campanha de uma marca de papel higiénico que vou escusar de referir (escreverei apenas Marca). Nesta campanha eram apresentadas três linhas. Bom, mas o melhor é lerem os comentários dela:

Marca linha Ultra: Relevo de flores, perfume e uma micro textura, que, segundo o texto da embalagem, proporciona aos seus felizes utilizadores "suavidade de uma pétala de rosa". Perguntar não ofende: alguém já limpou o cú com uma pétala de rosa???

Marca linha Ultra Soft Color, laranja que vem com extracto de pêssego. Como se o cú da gente conseguisse ver a cor e sentisse o cheiro...

Mas, demais é o Marca linha Ultra Protection, o top de gama. Este Rolls Royce dos papéis higiénicos, além de conter óleo de amêndoas ("garante maciez superior e um cuidado maior com a sua pele") na sua delicada fórmula, vem com Vitamina E (!!!). Para quem é que interessa esse negócio de cagar e sair com o cú vitaminado?


PS. Não sou nenhum santinho nem minimanente puritano, mas como vós sabeis amigas leitoras e amigos leitores eu não sou nada de palavrões. Só que não resisti a esta transcrição.
Histórias de provincia

Tenho andado a ler um blog de histórias. O autor, que na verdade desconheço, conta histórias de uma forma simples, mas que cativam na leitura. Já o linkei. Pena que não tenha o e-mail dele para o incentivar. Se souberem, avisem-me.
Adenda ao PS do post anterior

No mesmo site indicado tem lá essa: "O gato lambendo as patas e lavando a cara com estas, é sinal de chuva". Isto eu já vi o Schubert fazer muitas vezes. Mas uns dias faz sol, outros chove. Será que o Schubert ainda não sabe ler? Tenho de lhe mostrar o site para ele não me andar a enganar.
Calos e chuva

Já vos falei do meu pôr-do-sol de ontem. Eu, como vós bem sabeis meus amigos leitores e minhas amigas leitoras, não sou nada de superstições. Mas tem crendice popular… fala sério aí…
É que ao olharmos aquele céu bonito, com nuvens de bom tempo, se eu soubesse pintar teria feito um quadro impressionista que nem vos conto. E a Maria José a dizer. “Desta vez nem sei porque me está a doer um calo. Com um tempo destes não é normal. Nada indica que vá chover.” Ai não? Então vejam o maravilhoso dia que aí está. E eu que já estava preparado para ir ao Pomarão (sim, lá no Alentejo profundo), à festa do peixe do rio. Mesmo assim vou arriscar.
A propósito de crendice popular consultei um almanaque brasileiro, que tem lá tudinho sobre a meteorologia e a crendice. E entre outras a frase “Dor nos calos e nas juntas, quebraduras, chuva próxima”. Então é porque não é mania da minha Maria, não é? E para quem não tem pachorra para andar de link em link vou transcrever, com a devida vénia, uma oração que achei muito curiosa, para rezar quando a chuva é de mais:

Oração para fazer parar a chuva:
"Senhô meu Jesus, amado de todo meu coração, trago-vós. A chuva que vóis mandô, pra nós já chega, agora peço, peço pra vóis uns dias de sor pra tempero da chuva (pede-se o número de dias de sol que se quer: 10 ou 15) e depois o Senhô Amado meu Jesuis vós sabe do meu coração e eu não sei do coração de vóis, pela santa fé que tenho em vós, tenho certeza que vóis me favorece, por este meu pedido que peço pra vóis. Pelas dores de vossa mãi, pelo amô da Virgi Santíssima nossa soberana, pelo amô de vóis que este meu pedido será aceito que vóis está aqui no meu coração guardado e vóis me favorece Sinhô Deus de Misericordi."

PS. O Schubert tem pouco mais de um mês. Ainda não descobri se existe algum comportamento especial do meu gatinho, quando a chuva se aproxima.
E as crianças Senhor…?

Bem sei que o que vou escrever aqui não é politicamente correcto. Ser de esquerda, não é obrigatoriamente ser carneiro e alinhar pelo mesmo diapasão, quer se concorde, quer não. Pelo menos é o que eu acho. E por achar isso, nunca deixei de considerar que me coloco bem à esquerda. Uma esquerda de livre pensamento. Ontem estourou mais um escândalo na Câmara de Lisboa. Quem me conhece, e alguns posts que aqui escrevi anteriormente, sabe que eu não morro de simpatias pela actual vereação Lisboeta. Bem antes pelo contrário. No meio do trânsito e da balbúrdia de Lisboa, escutei uma longa entrevista nas notícias das 17h da TSF à vereadora da Câmara de Lisboa que tinha assinado um despacho para as escolas, sobre uma iniciativa da MacDonalds, no intuito de proporcionar a 5 crianças carenciadas, o acompanhamento dos jogadores de futebol no Euro 2004. Este despacho continha uma inconstitucionalidade, pois descriminava as crianças portadoras de deficiência física ou mental. Ora bem, na minha simples e talvez irrelevante opinião, a Câmara de Lisboa, querendo associar-se à iniciativa, deveria ter negociado com a MacDonalds, no sentido de que esta clausula não fosse incluída. Não o fez, e mal. No entanto, verificando que meteu “o pé na argola”, e segundo a informação da mesma vereadora, terá encontrado uma solução que “remediaria” o caso e que consistia, não só em levar as tais 5 ditas carenciadas crianças, mas também, proporcionar o mesmo número de entradas a crianças com handicap, que não iriam acompanhar os jogadores, mas sim assistir aos jogos, em local onde pudessem ter segurança e conforto. Estava portanto aberta, a possibilidade de, não 5, mas 10 crianças irem assistir aos jogos do Euro (sem contar com os necessários acompanhantes, para as 5 crianças deficientes). Hoje li nos jornais, que a Câmara Municipal, entretanto, devido a toda a polémica levantada desistiu da sua adesão a esta iniciativa. Concluindo. Apesar do processo ter sido pessimamente conduzido no início, fico hoje a saber que acabam por ficar 10 crianças sem poder assistir aos jogos, devido a todo o alarido que se levantou. Estão satisfeitos?
É de noite que me lembra o dia

Ontem fui ver o pôr-do-sol à Costa da Caparica. A tarde estava fresca mas agradável. O dia tinha sido uma estucha de dor e trânsito. Esta cidade está pior. Quando escrevo pior deveria relativizar. Eu deveria ter dito pior do que eu esperava que estivesse ou, pior do que eu acho que deva estar. Mas pior chega. Chega para perceber que cada dia que passa menos me agrada o funcionamento da minha Lisboa.A manhã quase toda sem me poder mexer, devido à maldita ciática. O almoço agradável, uma pizza feita pela minha filhota, leve, como se quer para quem teve de juntar o pequeno-almoço ao almoço. Depois, Lisboa. Os buracos, o trânsito caótico e o pagamento duplicado do estacionamento. O tipo que acena com um jornal ou revista enrolado, um lugar que eu já descortinei antes, um “destroce, destroce”, um “oh amigo, não se arranja aí uma moedinha?”. Não conheço o tipo de lado nenhum, qual amigo? Não sei porque tenho de lhe dar a moedinha, mas dou-lhe. Eu próprio a alimentar as faltas de soluções desta cidade, deste país. Só depois me lembro que fiquei sem moeda para o parquímetro. Um quiosque ou um café, um jornal ou uma bica, sempre se arranja trocos. Desvios de trajectória por causa das obras, avenidas de 3 faixas, reduzidas a duas, porque há uma segunda fila de estacionamento paralela, tipos que saem deste, sem piscas, taxistas que entram à “má-fila” e fazem a rotunda sempre por fora, onde quer que seja que vão, pois os outros que cedam, e não escrevo mais, porque reviver o pesadelo desta Lisboa, dos tapumes de mamarrachos em construção, dos parques mayeres prometidos, dos túneis caprichosos, dos tipos com um rolo de papel na mão, reviver o pesadelo. Felizmente, havia pôr-do-sol na Costa da Caparica.